Polarização e política do medo

 

polarizacao-azul-vermelhoHá duas salientes linhas de pensamento hoje no Brasil. Eu as chamarei de A e B, e descrevo as duas abaixo:

 

Linha de pensamento A

Há um plano de ação em processo, com a intensão de implantar o comunismo/socialismo totalitário no Brasil. Para alcançar esse objetivo, os orquestradores desse plano (muito representados por políticos de esquerda), pretendem trazer abaixo todos os valores cristãos, que são a principal barreira impedindo que esse desejo se concretize. Para tal, esse grupo esquerdista é capaz de qualquer coisa, até mesmo corromper crianças através do homossexualismo e a pedofilia. Esse plano se disfarça de uma coisa boa, se manifestando na forma de movimentos por direitos humanos, direitos LGBT, feministas, etc, ganhando assim muitos adeptos. Mal sabem eles que são “massa de manobra” para fins sinistros.

 

Linha de pensamento B

Há um plano de ação em processo, com a intenção de implantar uma nova ditadura no Brasil. Os orquestradores desse plano – representados por políticos de direita em parceria com grandes corporações – contam com o apoio de muitos religiosos, que são facilmente manipulados por pastores (especialmente da igreja evangélica). As pessoas que apoiam esse plano, religiosos ou não, costumam ser racistas, homofóbicas, preconceituosas em geral. Eles acreditam numa forma moderna, mais disfarçada, de escravatura através do trabalho; pois a maioria deles são pessoas com dinheiro, e carregam um grande rancor do pobre.

 

Se você achou a primeira linha de pensamento absurda, é bem provável que a segunda lhe soe plausível. Se o pensamento A faz sentido para você, você deve ter achado o pensamento B completamente insano. Isso é a polarização.

Qual das duas linhas de pensamento está correta? Nenhuma. O motivo pela qual uma delas provavelmente soa plausível para você (e para mim, eu não estou imune a esses processos) pode ser explicado pela heurística.

 

Heurísticas

 

Segundo a Wikipédia, heurística “é um método ou processo criado com o objetivo de encontrar soluções para um problema. É um procedimento simplificador (embora não simplista) que, em face de questões difíceis, envolve a substituição destas por outras de resolução mais fácil a fim de encontrar respostas viáveis, ainda que imperfeitas. Tal procedimento pode ser tanto uma técnica deliberada de resolução de problemas, como uma operação de comportamento automática, intuitiva e inconsciente”.

626381112Nós fazemos isso o tempo todo. O cérebro humano desenvolveu técnicas de solução rápida de problemas, que podem ser muito úteis, mas que muitas vezes causam falhas de julgamento. O exemplo mais clássico é o da heurística da disponibilidade, na qual um julgamento é feito baseado no primeiro pensamento que vem à mente.

O Dr. Jerome Groopman (apud Skeptical’s Dictionary) exemplifica essa heurística com o caso de um médico que diagnosticou vários casos de pneumonia viral no decorrer de algumas semanas. Uma paciente então apresentou sintomas similares, mas não apresentou as características manchas brancas no raio-x do pulmão, típicas de pneumonia viral. O médico a diagnosticou como estando nos estágios iniciais de pneumonia. Ele estava errado. Outro médico apresentou o diagnóstico correto: envenenamento por aspirina. O julgamento do primeiro médico havia sido atrapalhado pela grande disponibilidade de casos com o mesmo diagnóstico.

Nós não compramos um bilhete de loteria pensando nas chances extremamente baixas de recebermos o prêmio, mas nos casos de vencedores que vemos nos jornais e nos comerciais. Essas imagens estão mais disponíveis do que os números concretos da probabilidade, levando muita gente a superestimar suas chances. Assim, também, sempre que os noticiários estampam o rosto de terroristas islâmicos na TV, aumentam os ataques a estrangeiros (principalmente árabes, mas muitas vezes também mexicanos e indianos) nas ruas dos Estados Unidos. As chances de ser morto por um americano branco, por um bebê ou por um cortador de gramas são muito maiores do que por um terrorista mulçumano, mas a heurística da disponibilidade faz com que as pessoas vejam o mulçumano como uma ameaça maior.

Evitar esses erros de julgamento dá trabalho. É preciso ponderar, buscar o máximo possível de informações sobre o assunto, analisar versões com pontos de vista diferentes, etc. O uso das mídias sociais também colabora para intensificar a ocorrência de heurísticas.

As pessoas recebem grandes quantidades de informações através da internet, o que as força a fazer julgamentos ainda mais rapidamente. Além disso, o sistema de mídias sociais como o Facebook, intensifica a disponibilidade cada vez mais radical de um ponto de vista. Quando você clica em um artigo que foi compartilhado por um colega, o Facebook recebe essa informação como uma indicação de interesse por determinado assunto. Baseando-se nessa informação, ele passa a disponibilizar mais links sobre esse assunto, autor, veículo, etc. Então digamos que você clique em um artigo de uma revista de ponto de vista predominantemente de direita. Mais artigos de direita vão aparecer e você vai clicando. Em um determinado momento, todos os links vão apresentar um ponto de vista mais de direita, te deixando sem a opção de visualizar um ponto de vista diferente.

É comum, também, participar de grupos online onde mais pessoas compartilham um ponto de vista. Stuart Sutherland, em “Irrationality” (1992), explica que, quanto mais se convive com pessoas de um mesmo ponto de vista, mais essas pessoas se radicalizam para aquela linha de pensamento. Pessoas com o mesmo ponto de vista, validam e encorajam esse pensamento, e a falta de contra-argumentos – por evitarmos pessoas que pensam diferente – faz com que crenças se intensifiquem cada vez mais. Nós agimos assim por gostarmos de sentir que estamos corretos e receber a aprovação do grupo; encaramos a discordância como uma afronta, uma ofensa.

 

O medo

 

Suzanne Zeedyk explica o sucesso de Hitler através do medo e, acima de tudo, a origem do medo. O cérebro em desenvolvimento possui um sistema FEAR (medo) que funciona como um músculo; quanto mais ele é ativado na infância, mais sensível ele fica. Crianças que sofreram abuso, por exemplo, costumam ter esse sistema muito sensível. É como um alarme automotivo que dispara toda vez que alguém encosta no carro. O menor dos estímulos pode desencadear um ataque de pânico, ansiedade, agressividade, ou qualquer que seja a reação. Isso pode perdurar até a vida adulta. A geração de Alemães que apoiou o nazismo de Hitler, viveram uma infância na qual o “conselho da moda” dado aos pais era de uma criação autoritária dos filhos. Na criação autoritária predomina a disciplina, alcançada através de punições (sejam físicas, castigos ou humilhações) e ameaças. Esse tipo de criação ativa o sistema FEAR do cérebro em desenvolvimento com muita frequência.

Na vida adulta, quando esse sistema continua sensível, há um medo irracional de ameaças externas. Para justificar esse sentimento, essas pessoas criam um inimigo, que pode ser, no caso da Alemanha nazista, os judeus, negros, etc… As pessoas se unem contra esses inimigos em comum, sentem-se parte importante de uma comunidade, sentem-se mais seguras. Onde há medo generalizado, há sempre uma pessoa (ou mais pessoas) disposta a usar isso para alcançar o poder. Hitler não teria sido tão bem-sucedido, e feito o estrago que fez, não fosse o apoio que recebeu das pessoas (lembrando que não foram todos os alemães que apoiaram Hitler; não é preciso que todos, ou mesmo a maioria, apoiem uma pessoa como ele para que ela seja bem-sucedida).

O mesmo acontece hoje em dia. Figuras totalitárias recebem apoio das massas por representarem um sentimento de segurança. Para uma pessoa com o sistema FEAR soando o alarme constantemente, é beneficial sacrificar sua liberdade em nome da segurança.

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A polarização é um fenômeno que costuma preceder um momento histórico traumático, guerras civis ou guerras entre países, por exemplo. Em pleno 2016, ela tem acontecido no mundo todo, acelerada pela internet e viabilizada pelo medo. No Brasil, ela se manifesta na forma dos times A e B, que seguem os pensamentos A e B mencionados acima. Não é preciso que você concorde inteiramente com um deles, se identificar em parte é o suficiente para ser acatado por um grupo e se tornar inimigo do outro; aos poucos a sua afinidade com esses ideais deve se intensificar.

Enquanto o time A e o time B brigam entre si, o pequeno grupo de pessoas no poder lutam por elas mesmas; fazendo alianças com quem lhes for conveniente, apoiando o time que lhe for conveniente, promovendo e executando ações que lhes são convenientes, tudo em nome da manutenção do poder. Quando mais intensa a polarização, mais facilidade essas pessoas têm de permanecer e aumentar seu poder, se preocupando somente com as falcatruas e picuinhas entre eles mesmos.

Enquanto a população brigar entre si e enxergar uns aos outros como inimigos, continuaremos em declínio. Quando aceitarmos diferentes opiniões e o constante debate como parte fundamental para a manutenção da democracia, as coisas tendem a fluir. A população mais crítica, unida e reflexiva é mais forte para se defender contra a manipulação de oportunistas em busca de poder.

 

debate1O que fazer?

– Reflita sobre si mesmo, sobre o motivo para suas opiniões e pontos de vista; busque ser mais aberto a novas informações e mais flexível; tente reconhecer os momentos em que seu julgamento foi afetado por heurísticas.

– Se relacione e converse com pessoas que pensam diferente de você. Mesmo que você não concorde com elas, tente entender porque essas pessoas pensam assim e acima de tudo, respeite-as.

– Pratique a empatia com mais frequência; tente sentir o que o outro sente, se colocar em seu lugar e imaginar como é essa realidade. Procure não enxergar outras pessoas como “inimigos”, mas como pessoas que viveram outras e experiências e discordam de você. Tanto ela quanto você podem mudar de ideia um dia e acabar descobrindo que têm muito em comum.

– Debata com pessoas diferentes. A única forma de validar um ponto de vista é tentando provar que ele está errado. Escute argumentos conflitantes e reflita novamente sobre seus conceitos. Você pode manter a mesma opinião, adaptar seu ponto de vista ou mudar de ideia completamente.

– Procure saber mais sobre um assunto antes de expressar sua opinião na internet. Use fontes com pontos de vista opostos para elaborar sua opinião.

– Tente ver o mundo como um espaço para a colaboração e não para conflitos.

 

Observação: eu não me excluo dessa lista. Tenho tentado seguir esses passos (é um processo contínuo) e acabei descobrindo muitas coisas sobre mim mesma, meus preconceitos e vieses, e também tenho aprendido muito sobre pessoas com vidas completamente diferentes da minha. Ainda tenho muito a aprender, mas sinto que a minha vida se tornou muito mais fácil e positiva depois desse choque psicológico e por isso recomendo.

Sobre o mau comportamento

diego2No ano passado, o vídeo de um menino de sete anos – vamos chama-lo de Diego – na cidade costeira de Macaé, no Rio de Janeiro, se tornou viral. No vídeo, o menino vira cadeiras, mesas, joga objetos pela sala, faz uma bagunça danada. Os professores ficam a sua volta, parados, sem saber o que fazer. Uma funcionária, acredita-se que seja a diretora da escola, diz: “Eu quero saber com a orientação educacional, com a assistente social, com a polícia, o que a gente faz com uma criança dessas?”. O vídeo foi compartilhado quase 30 mil vezes, recebendo mais de 23 mil comentários, muitos dos quais são perturbadores.

First comment: "lack of a beating"; second comment: "thank god my parents beat me up as a kid so today I`m not a worthless criminal or a thief, always respected everyone including my parents". Third comment laments that, in Brazil, psychologists and human rights restrain people from providing "proper education" (?) imposing limits to children.

First comment says "beat him up"; the other suggests he`s taken to a prison so the police would "freak him out".

Ainda no vídeo, um dos funcionários (talvez a diretora) instrui os outros a não tocarem na criança e esperarem até que sua mãe chegue na escola. “A gente não pode bater nele, não pode segurar ele”. Não, não pode; mas também não deve (voltarei a falar sobre isso mais para frente). O garoto acabou indo parar no Fantástico, onde os especialistas entrevistados lamentam o fato de professores se sentirem presos e não poderem impor limites em crianças como ele.

O que mais me chateia – além da grotesca exposição dessa criança – é que isso mostra o quão despreparados, não apenas pessoas em geral (incluindo pais e responsáveis), estão educadores, psicólogos e outros profissionais ao lidar com uma criança de comportamento difícil. E isso não é exclusivo do Brasil. No Reino Unido, em 2012, “mais de 40% dos pais admitiram ter punido fisicamente ou batido em uma criança no decorrer de um ano (…) e cerca de 77% gritou com os filhos” (Sunderland, 2016, p.178).

Eu não os culpo. A maioria dos pais aprendeu que se deve “disciplinar” os filhos para que eles se comportem bem. Eu também já pensei da mesma forma, mas eu tenho aprendido muito desde que me tornei mãe e trabalhando com crianças – e eu gosto de compartilhar aquilo que aprendo, então vamos lá. A seguir, explicarei porque crianças se comportam mal e o que fazer a respeito.

 

Pequenos cérebros, grandes emoções

Os seres humanos nascem com o lobo frontal subdesenvolvido. Trata-se da parte do cérebro responsável pelo pensamento claro e intenções. Isso significa que não nascemos com a habilidade de controlar nossas emoções. Nós aprendemos isso através de nossas conexões com os adultos a nossa volta, como familiares, educadores, etc. Dessa forma, o mau comportamento costuma ser resultado de um cérebro imaturo.

frontal lobe

Em contraste com o lobo frontal, desde o nascimento, a parte inferior do cérebro humano está funcionando completamente. Essa região do cérebro

“contém sete forças hormonais enormes – os sistemas emocionais geneticamente arraigados. Há três sistemas de alarme – RAGE (frustração, irritação), FEAR (medo) e PANIC/GRIEF (pânico, perda, angústia da separação) – e três sistemas calmantes, de bem-estar e pro-sociais – CARE (afeto), SEEKING (procurando, desejo, antecipação) and PLAY (brincadeira, alegria, despreocupação) – e, finalmente, LUST (acasalamento). Esses sistemas são como músculos, quanto mais os ativamos, mais eles se tornam parte da personalidade”. (Sunderland, 2016, p.19)

Para uma criança, pequenas coisas como cansaço e fome podem ser motivo para uma crise de mau comportamento. Por causa do lobo frontal desenvolvido, adultos possuem a habilidade de compreender porque estão irritados e ir buscar algo para comer, descansar, caminhar ou qualquer coisa que os faça se sentir melhor. Crianças precisam de um adulto que as ajude a entender e lidar com seus sentimentos. O que parece pouco para um adulto, para uma criança pode ser super estressante.

Quando crises de mau comportamento não são lidados apropriadamente na infância, elas podem continuar ocorrendo na vida adulta. Se você trabalha com atendimento ao cliente, provavelmente já se deparou com um desses adultos.

 

Motivos para o mau comportamento de acordo com Sunderland:

– Fome ou cansaço;

– Alimentação (açúcar, adoçantes e certos aditivos nos alimentos podem afetar o comportamento da criança);

– Cérebro emocional ainda pouco desenvolvido (conforme explicado anteriormente);

– Cérebro pouco estimulado (enquanto adultos podem ligar o rádio ou algo do tipo, crianças podem tentar estimular a si mesmos causando uma situação com seu comportamento);

– Necessidade de reconhecimento (crianças que estejam buscando a atenção de adultos podem usar o comportamento como uma forma de consegui-la);

– Necessidade de estrutura (falta de estrutura, como uma rotina clara);

– Necessidade de ajuda com um grande sentimento (tensão devido a um evento em particular na vida da criança);

– Absorvendo o stress dos pais;

– Parte errada do cérebro da criança sendo constantemente ativada.

O último ponto merece atenção especial, pois nesse caso é preciso que os pais, responsáveis ou educadores mudem sua forma de se relacionar com a criança. Sunderland explica que

“Um dos principais motivos que levam crianças a se comportarem mal é devido à forma como os pais se relacionam à criança, ativando a parte errada do cérebro. Você terá mais dificuldades com os filhos se a criação estiver ativando os sistemas RAGE, FEAR ou PANIC/GRIEF do cérebro inferior. Você terá momentos mais agradáveis se ativar os sistemas CARE, PLAY ou SEEKING”.

Gritar, punir fisicamente e ameaçar a criança com frequência irá superestimular os sistemas RAGE, FEAR e PANIC/GRIEF, tornando a criança mais suscetível a crises de mau comportamento; e não o oposto, como a maioria das pessoas comentando no vídeo do Diego parecem acreditar.

“Da próxima vez que estiver prestes a dar bronca em uma criança (normalmente por causa de um comportamento que você não gostou), pergunte-se se há uma forma mais gentil de se expressar – por trás de todo comportamento há uma necessidade emocional, e não é a necessidade de levar bronca”. (Suzanne Zeedyk)

Há dois tipos de crises de comportamento, a crise aflitiva e a de Pequeno Nero. Ambas devem ser levadas a sério e tratadas apropriadamente, de maneiras diferentes.

 

Crise aflitiva

Use your developed frontal lobe to control your emotions and deal appropriately  with a challenging child.

Use o seu lobo frontal desenvolvido para julgar a situação e lidar com a crise da criança apropriadamente.

“Uma crise aflitiva indica que um ou mais dos sistemas de alarme foi fortemente ativado. Esses sistemas de alarme são RAGE, FEAR e PANIC/GRIEF. Isso resulta no estado de alerta da criança se desequilibrando, com níveis excessivos de componentes do stress fluindo pelo corpo e cérebro”. (Sunderland, 2016, p.184)

Esse tipo de crise pede uma aproximação do adulto, para acalmar a criança. Segurar a criança com carinho, oferecendo palavras calmantes, ajudará a fazê-la se sentir segura novamente. Então, assim que a criança estiver se sentindo mais calma, a melhor coisa a fazer é distraí-la – com uma canção, mostrando algo interessante, etc.

Castigos e punições, isolar a criança em um quarto, ignorar ou não dar atenção a essas crises de comportamento pode ser prejudicial, podendo levar a crises mais longas e mais frequentes.

 

Crises de Pequeno Nero

Essa é bem diferente da crise aflitiva e pede uma resposta diferente. O adulto, nesse caso, deve dar menos atenção à criança. Essa crise reflete o desejo de manipular o adulto – quando a criança quer um doce, por exemplo, e tenta convencer os pais a compra-lo gritando e não cooperando. Se a criança consegue o que quer, ela continuará tendo uma crise toda vez que ouvir “não”.

Não adianta tentar argumentar, negociar ou persuadir a criança durante a crise de Pequeno Nero, pois só estará dando a ela a atenção que ela está pedindo. Não grite com a criança, pois ela irá aprender que esse é um comportamento aceitável.

Normalmente, a criança que está tendo uma crise de Pequeno Nero vai parar ao ser ignorada; ou quando compreender que receberá atenção do adulto quando estiver calma e pedindo algo educadamente. Entretanto, algumas vezes, uma crise de Pequeno Nero pode escalar para uma crise aflitiva. É importante saber distingui-las para que sejam lidadas corretamente. Se a criança muda de um comportamento onde ela dá comandos ou exige algo incessantemente para um estado de dor genuína, a criança precisará de ajuda para lidar com seus sentimentos.

Suzanne Zeedyk nos lembra que “mesmo crises de Pequeno Nero refletem uma criança tendo dificuldades ao lidar com seus próprios desejos; então, carinho sem limites” é sempre a melhor abordagem.

 

No caso de Diego, ele não estava exigindo nada; ele silenciosamente destruía a sala dos professores. Eu diria se tratar de uma crise aflitiva. Ele estava tentando lidar com um sentimento muito forte e não sabia como, resultando no seu comportamento destrutivo.

Pessoalmente, essa é a minha forma de lidar com a situação – apesar de haver outras formas de lidar com ela: eu o levaria (sem machucá-lo de nenhuma maneira) para algum lugar, provavelmente do lado de fora, onde ele não pudesse causar muitos danos ou se machucar. Eu usaria frases calmantes, como: “Está tudo bem; ninguém está bravo com você; não se preocupe; vai ficar tudo bem”. Eu esperaria ele se acalmar e me sentaria ao lado dele, talvez colocando uma mão no seu ombro ou costas (se ele deixar) para oferecer conforto. Eu então conversaria com ele, para tentar descobrir o que causou a crise. Perguntas simples, como: “Como foi o seu dia?” , podem ser bem elucidativas. Talvez houve um desentendimento com um colega, talvez ele sofreu bullying, ou talvez algo esteja acontecendo na casa do garoto. Pode ser que ele não diga nada ou queira falar sobre outra coisa, ou brincar. O importante é que ele agora está mais calmo e pronto para retornar a sua rotina.

É importante lembrar que para lidar com crianças com frequentes crises de comportamento é preciso muita paciência. Crianças precisam de tempo para aprender a lidar com seus sentimentos ou pedir ajuda a um adulto. E que gritar, punir fisicamente, isolar ou humilhar a criança não são métodos eficientes. Diego foi filmado e exposto a milhares de pessoas, muitas das quais expressaram o desejo de puni-lo agressivamente e usaram palavras ofensivas para se referir a ele (trombadinha, marginal, futuro criminoso, diabo, etc). Isso é um abuso (coletivo) verbal e emocional de uma criança; sendo essa uma das principais causas para crianças e adultos se comportarem inadequadamente. Eu espero que Diego esteja bem, mas eu não me surpreenderia se depois disso tudo o seu comportamento não tenha melhorado. Eu espero que um adulto sensato e carinhoso o esteja ajudando a lidar com seus sentimentos.

When children behave badly

diego2Last year, a video of a seven-year-old – I`ll call him Diego – in a coastal town of Rio de Janeiro state called Macae, in Brazil, destroying the teacher`s lounge of his school became viral. In the video, the child knocks down chairs, tables, throws stuff around, makes a huge mess. The teachers stood around him, not knowing what to do. One staff, thought to be the principal, is heard making comments like: “What do we do with a child like this? Call social services, correctional office, the police?”. It was shared nearly 30 thousand times on Facebook, receiving more than 23 thousand comments, much of which were disturbing.

 

First comment says "beat him up"; the other suggests he`s taken to a prison so the police would "freak him out".

First comment says “beat him up”; the other suggests he`s taken to a prison so the police would “freak him out”.

First comment: "lack of a beating"; second comment: "thank god my parents beat me up as a kid so today I`m not a worthless criminal or a thief, always respected everyone including my parents". Third comment laments that, in Brazil, psychologists and human rights restrain people from providing "proper education" (?) imposing limits to children.

First comment: “lack of a beating”; second comment: “thank god my parents beat me up as a kid so today I`m not a worthless criminal or a thief, always respected everyone including my parents”. Third comment laments that, in Brazil, psychologists and human rights restrain people from providing “proper education” (?) imposing limits to children.

In the video, one of the teachers (or maybe the principal), instructs the others not to touch the boy and wait for his mother to come and pick him up. “What can we do? We are not allowed to beat him or restrain him”. No, you are not allowed. But, also, you shouldn`t (I`ll talk about that in a second). The poor boy ended up in the news, and the experts interviewed regret the teachers feel they are not allowed to impose limits to children like him.

What upsets me the most – besides the gross exposure of this child – it`s that it shows how little prepared, not only people in general (including parents and carers), but educators, psychologists and other professionals are to deal with children with challenging behaviour. And this is not exclusive to Brazil. In the UK, in 2012, “more than 40 percent of parents admitted to physically punishing or hitting a child in the past year; (…) and around 77 percent yelled at their children” (Sunderland, 2016, p.178).

I don`t blame them, though. Most parents learned they were supposed to “discipline” their children in order for them to behave. I once thought the same way, but I`ve been learning a lot since I became a parent and by working with children – and I like to share things I learn, so here we go. Here`s why children misbehave and what to do about it.

 

Little brains, strong emotions

Humans are born with an underdeveloped frontal lobe, which is the part of the brain responsible for clear thoughts and intentions. This means we`re not born able to control ourselves, we have to learn it. And they usually learn through their connection with parents and cares – and also other adults around them, such as family members, educators, etc. So most misbehaving is a result of an immature brain.

frontal lobe

In contrast with the frontal lobe, from the moment we are born, our lower brain is fully functional. This area

“contains seven huge hormonal forces – the genetically ingrained emotional systems. There are three alarm systems – RAGE, FEAR and PANIC/GRIEF – and three calm and well-being, or pro-social systems – CARE, SEEKING, and PLAY – and, finally, LUST. These systems are like muscles. The more we activate one of them, the more it becomes part of the personality”. (Sunderland, 2016, p.19)

For a child, little things like hunger or tiredness can be a reason for a tantrum, or an outburst of misbehaviour. Adults are more able to understand why they are irritated and go get some food, rest, take a walk or whatever they know will help them feel better. Children need an adult to help them cope with their feelings. What seems like a small thing for an adult can be overwhelming for a child.

When tantrums and misbehaviour are not appropriately addressed in childhood, they might continue later on in adult life. If you work in customer service, you probably know what I`m talking about.

 

Reasons for misbehaviour according to Sunderland (2016):

  • Hunger and fatigue;
  • Food (sugar, sweeteners and a number of additives can affect children`s brains);
  • Undeveloped emotional brain (as previously explained);
  • Understimulation of the brain (while an adult might turn the radio on, children might stimulate their own brains by causing a situation);
  • Recognition hunger (children might be seeking adult attention and realises a tantrum gets a reaction);
  • Need for structure (a lack of structure, like a clear routine);
  • Needing help with a big feeling (tension due to a particular event in the child`s life)
  • Picking up on parent`s stress;
  • Wrong part of the child`s brain being activated.

This last one deserves especial attention, because it requires parents, cares and educators to change their approach. Sunderland explains that

“One of the main reasons why children behave badly is because the way a parent is relating to a child is activating the wrong part of the brain. You will have an awful time with your child if your parenting activates her lower brain RAGE, FEAR, or PANIC/GRIEF systems. You can have a delightful time if you activate her lower brain CARE (attachment), PLAY or SEEKING systems”.

Frequent yelling, physical punishment and threats will overstimulate the RAGE, FEAR, or PANIC/GRIEF systems, making the child more susceptible to bad behaviour and tantrums, and not the opposite as most people commenting on Diego`s video seem to believe.

“Next time you find yourself about to speak sharply to a child (usually for some bit of behavior you didn’t like) ask yourself if there is a gentler way you could convey your thoughts – because underneath all behavior is an emotional need, and it isn’t a need to be told off.” (Suzanne Zeedyk)

There are two types of tantrums, the distress ones and the Little Nero tantrums. They need to be taken seriously and require different responses.

 

Distress tantrums

“A distress tantrum means that one or more of the three alarm systems has been very strongly activated. These alarm systems are RAGE, FEAR and PANIC/GRIEF. As a result, your child`s arousal system will be way out of balance, with excessively high levels of stress chemicals searing through his body and brain”. (Sunderland, 2016, p.184)

These type of tantrums require the adult to get closer to the child, soothe her. Holding the child tenderly, offering calming words, will help her feel safe again. Then, once the child has calmed down, the best thing to do is to distract her – with a song, showing something interesting, etc.

Use your developed frontal lobe to control your emotions and deal appropriately with a challenging child.

Use your developed frontal lobe to control your emotions and deal appropriately with a challenging child.

Time-out techniques, putting a child in a room by herself or ignoring or disregarding this kind of tantrum can be harmful, possibly leading to longer, more frequent tantrums.

 

Little Nero tantrums

This is very different from the distress tantrums and requires the adult to react the opposite way, giving less attention to the child. This tantrum is about the desire to manipulate the adult – when a child wants sweets, for example, and tries to convince her parents to buy them by screaming and not cooperating. If the child gets what she wants, then she`s going to keep on doing it every time you say “no”.

There`s no point trying to argue, negotiate, reason or persuade the child, as that would grant her the attention she`s after. Also, don`t yell, as the child will learn this is acceptable.

Normally the child having a Little Nero tantrum will stop once ignored. Although, some children might move from a Little Nero tantrum to a distress tantrum. It`s important to distinguish them so they can be addressed correctly. If a child goes from nagging or giving you commands to a state of genuine pain, the child will then need help dealing with her feelings.

Suzanne Zeedyk reminds us, though, that “even Little Nero tantrums are still a child struggling with desire; so kindness without boundaries” is always the best approach.

 

When it comes to Diego, as he wasn`t demanding anything, he was quietly wrecking the room, I`d say he was having a distress tantrum. He was having to deal with really strong feeling and didn`t know how to, which resulted in the bad behaviour.

This is my personal approach to a situation like this, what I would do – though there are other ways of dealing with the situation: I`d take him (making sure I`m not hurting him in any way) somewhere, probably outside, where he can`t do much damage to property or himself. I`d use calming words such as “it`s ok; nobody is mad at you; you are ok; it will get better”, etc. I`ll wait for him to calm down and sit next to him if he lets me, maybe put my hand on his shoulder or back for reassurance. Then I`d talk to him and try to understand what triggered the tantrum. Simple questions like “how was your day” can lead to very elucidating answers on what could have winded up the child. Maybe there was a misunderstanding with other children, maybe he was bullied, maybe something is going on at home. He might not talk to me this time, or might prefer to talk about something else, or play a game. What matters it`s that the child calmed down and is now able to return to his routine.

It`s important to remember that dealing with children who often behave badly requires a lot of patience. It takes time for them to learn how to ask an adult for help and cope with their feelings. And that yelling, physical punishment, isolation and humiliation are not effective. Diego was filmed and exposed to thousands of people, many of them expressed the desire to physically punish him, and many others used unkind words to refer to him (calling him a future criminal, devil, rascal, etc). That`s collective verbal and emotional abuse of a child; one of the main causes for children and young adults to behave badly. I hope Diego is ok, but I wouldn`t be surprised if his behaviour hasn`t improved. I hope a sensible, caring adult is helping him deal with his feelings.

What my vegan baby eats

Healthy vegan baby

Healthy vegan baby

Raising a vegan child isn`t always easy. Not because of the food options, but because of people`s misunderstanding of what veganism is. I have been accused of depriving my child from his basic nutrition; loving animals more than my son; putting him at risk of malnutrition and anaemia; and a number of other less dramatic wrong-doing. Most of the time, when people find out about our diet, they fill me with questions and I can`t blame them; there is a lack of information and abundant misconception on the subject. So I try to take all the questions seriously and always answer them as well as I can, but there is so much to say it`s hard to squeeze it all in a few minutes of conversation before people get bored of the subject and start talking about how delicious steak is. So for those who are truly interested – and for my sake – I decided to write about the main questions I normally hear, one post at a time.

Probably the most frequent question I hear is: “What do you eat”?

First of all, I need to clarify something: we do eat. We don`t eat less than other people – if anything we eat more – and we don`t hate food, we`re not fussy (most of us, at least), and we are not just trying to lose weight (again, most of us). Also, veganism doesn`t have a standard menu we`re supposed to follow. It simply means we do not consume any animal products. That`s it. There are infinite ways of being vegan, including healthy and unhealthy ones. So it can be absolutely suitable for babies from weaning – or from birth in the case of formula-fed babies.

Now this is my son`s case:

My son was exclusively breastfed for over five months. Just before he turned six months, he seemed ready to start eating solids, so I gave him pureed butternut squash. He loved it. He also seemed very interested in feeding himself so I did a mix of baby-led weaning and pureed food – sometimes he would only eat if I fed him with a spoon, go figure. I kept breastfeeding on demand but would always try to give him food first so he would depend less and less on the breast.

For the baby-led part of his weaning I gave him pieces of fruit and veggies, such as cucumber, apple, banana, peaches, oranges, cooked potato and carrots, pasta (I recommend penne over spaghetti, way less messy) with tomato sauce and bits of veggies, things like that. Some of the fruit he wouldn`t eat whole, he would eat in a puree, like strawberries, so I blended some fruit together to feed him with a spoon. I also prepared porridge the American way, mixing oats and boiled water. I add pieces of fruit, mashed banana or purees to it for flavour – he loves it.

After a few months he was eating pretty much the same as me. This is how I plan our meals:

I have a whole-food, plant-based diet that`s also starch based. That means I don`t eat any animal products such as meat, dairy or eggs. It also means I cook from scratch, from real food, trying to avoid processed food (especially white flour, white bread, white anything) as much as I can. To be fair, I do buy some baby snacks for those occasions I don`t have time to prepare anything and need to be out with my son during most of the day. Most of our meals, though, are real food. To base your diet on starch means a big part of my meals is starchy food. So for every meal I either have a generous portion of grains (mostly rice and beans, because I`m Brazilian and this is culturally what we add to anything we eat), whole grain pasta or starchy root vegetables, like potatoes. The starchy bit is our main source of calories. Then I add veggies we like, trying to vary as much as possible so we get all the vitamins, minerals and amino-acids we need. My son eats about five times a day: breakfast, morning snack, lunch, afternoon snack and dinner.

These are some examples of typical meals:

1 – For lunch or dinner: Rice (preferably brown), black beans, roasted potato + carrots + parsnips, steamed broccoli and cucumber salad. Fruit for dessert.

2 – For lunch or dinner: Lasagne (whole grain sheets) made with tomato sauce, mushroom, aubergine, onions, leeks, carrots and courgettes. Vegan cake (with whole flour and brown sugar) for dessert.

3 – For lunch or dinner: Rice (preferably brown), potato curry with bell peppers and onions, lettuce and tomato salad. Vegan flapjack for dessert.

4 – For breakfast: oatmeal with fruits.

5 – For snack: fruit, rice cakes, chopped veggies, etc…

I know what you`re thinking: “How about the protein”? Believe it or not, there`s plenty of protein in these meals I just mentioned. All plants have protein and my son and I are doing very well. He is 15 months old now and he is still gaining weight nicely, is very active and energetic, very smart and growing up fast, as any other healthy child. My last blood tests came out great and I don`t take any supplements, neither does my son (Though I keep an eye out for vitamin B12 and D, I`ll write more about it on another post).

If you are interested and want to know more about the subject, I recommend the following books, videos and websites:

Books:

The China Study

Whole

Documentaries:

Cowspiracy

Forks Over Knives

Videos:

Starch Solution

101 Reasons to Go Vegan

Websites:

Vegan Society

Nutrition Facts

Hempmeds se apropria do nome de outras marcas

No dia 18 de novembro de 2015, a empresa Hempmeds registrou o nome da marca Revivid no Brasil. A empresa americana Revivid é a principal concorrente da Hempmeds no País, já que também fabrica óleo rico em CBD e possui uma vasta clientela no Brasil.

O registro foi feito pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e ainda aguarda exame de mérito. Segue um print da descrição dos produtos que a marca representaria:

registro revivid2

O uso da palavra “medicinal” aparece em todos os exemplos de produtos, significando que a Hempmeds precisaria de uma licença de marketing especifica para vender produtos medicamentosos. Para isso, segundo a Anvisa, é preciso haver prova de segurança e eficácia desses produtos, o que normalmente significa estudos clínicos para cada um desses produtos.

Será que a Hempmeds tem mesmo intenção de usar a marca Revivid? Ou simplesmente registrou o nome para a verdadeira Revivid não conseguir usar sua marca no Brasil?

Quando se trata de propriedade intelectual, especialmente uma marca que já tem sido usada há anos em outro local, é fácil provar que a Hempmeds não possui direitos sobre o nome Revivid. No entanto, o processo é custoso e lento no Brasil, necessitando de advogados, tradução de documentos e uma série de inconveniências para a empresa. Nesse meio tempo, é possível que a Hempmeds tenha mais essa vantagem sobre a concorrência, ou até comercialize produtos com o nome Revivid para confundir pacientes que já utilizavam a marca original.

 

registro revividPor outro lado, a justiça determinou que a Hempmeds está proibida de fazer propaganda do seu principal produto, o RSHO, até mesmo em seu site. Conforme eu havia mencionado em outro post, o RSHO não tem registro na Anvisa e a Hempmeds não tem licença para vender medicamentos no Brasil, mas insistia em declarar que seus produtos são medicinais.

Eles resolveram, então, colocar no site brasileiro a mesma declaração feita no site americano, afirmando que: “Estas declarações não foram avaliadas pela FDA e não são destinados a diagnosticar, tratar ou curar qualquer doença”.

 

hempmedsbrsite

A página oficial da Hempmeds no Facebook, entretanto, ainda afirma que a empresa produz e vende medicamentos:

hempmedsfb

Será que a empresa vai começar a se comportar no Brasil, ou vai continuar com essa conduta duvidosa?

Attachment vs Overprotection

overprotectionAfter my latest post on attachment, some of my friends expressed their concern on what would be crossing the line from attachment parenting to overprotection. They said maybe I was too concerned about my son`s emotions and would eventually end up spoiling him. Instead of dismissing my friends` concerns with “I know what I`m doing” – because, in fact, most of the time I don`t – I felt the need to clarify a few things about what it means to use attachment theory to make decisions as a parent. Bear in mind I only learned most of what I know about attachment very recently and I`m still learning about it. However, I am very interested in social psychology and really enjoy reading about it, which is part of the reason why the whole attachment thing made so much sense to me in the first place. Also, I`m a parent, not a scientist, so please don`t think I`m trying to know more than everybody else, I`m just sharing my experiences and what I learned. So here are the main points:

 

What it means to overprotect

 

The prefix “over” invokes a negative connotation, so the term itself suggests you`re crossing the line when it comes to protection. To my understanding, if you are overprotecting you are preventing your child from being independent, exploring and finding their own little adventures; probably because you are too afraid they might get hurt, physically or emotionally. I don`t believe that`s healthy, because the child will end up depending too much on the parent (or whoever is responsible for the child, if you don`t mind me stressing) and won`t learn resilience, which is utterly important for the child`s development.

That`s not what attachment is about. It`s about trying to understand the child`s needs and being there for them when they need you, so they can build their own confidence, learn about the world and let us worry about their safety – and that means making sure they feel safe. That`s where emotions come in; when children feel safe they learn more, build confidence and independence.

 

Parenting formula

 

There`s no such thing. Doubt anyone who claims you can follow certain instructions and it will work out for you and your child, at least most of the time. These claims end up leading parents to force a certain behaviour on their children and when it doesn`t work out they feel as though their children are not normal or that they did something wrong. That`s also not the point of attachment.

Every child is different and every parent is different. What works for some may not work for other people and if that sounds obvious, it`s because it is. It doesn`t mean it`s easy to get. Understanding what your child needs can be really hard (To be honest, I never heard anybody say it`s easy) and parents are constantly under pressure from family, friends, neighbours and people everywhere full of conflicting advice that might make them even more confused. It`s especially hard to know who to listen to, and how to listen to your child when you are sleep deprived, stressed and frustrated. I try to avoid judging parents while sharing my opinion and my experiences, but I understand it`s easier to identify what`s wrong rather than what`s better, or what can work. Even when you police yourself some judgement slips, especially on social media where people get braver than they would in a face-to-face conversation.

So even when people say there`s no formula they are quick to point out what`s right or wrong, which means they are following a set of rules. Forget that. Attachment is not about following instructions, it`s about adapting to your child`s needs; which means it`s going to be different for every parent, and every individual child, even siblings.

To illustrate that: if your child cries every time you put him/her down, I`d suggest you put him/her in a sling and go ahead with your routine. It would have worked for my son and it would have made my life easier. The problem is that I have a bad back and couldn`t carry him around. I had to reduce my work load in the house, do stuff when he was asleep or have people take care of him while I cooked and did housework. It wasn`t easy but he eventually grew out of it and didn`t need me so often.

I also planned to breastfeed my son until he was at least 24 months old, but by the time he was one, breastfeeding was making me tired and my nipples hurt as my son sometimes bites them. He eats his food very well so I managed to wean him out of the breast during the day without a lot of fuss. During the night, however, as I mentioned on my previous post, he wasn`t ready for giving up the breast. I`m still breastfeeding during the night, but I`m not tired anymore as it`s way less than when he was feeding on demand.

These are little adaptations considering my son`s needs, but also mine. I am making sacrifices, I`m having to adapt, and that`s ok. And it wasn`t easy to get to these decisions, I struggled to understand these were things I could do, but I got there, not following a set of rules, but connecting with my child. He`s only one, though, I still have a long way to go.

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Follow your instincts/intuition

 

Mothers have this reputation of having great intuition, being so connected with their instincts; it`s like they always know what to do, right? I hate this assumption. It makes me feel, when I don`t know what to do, that my motherly radar is broken; my psychic powers worn out. As Stuart Sutherland points out in his book “Irrationality” (it`s mostly on social psychology, but goes way beyond that; I highly recommend it): “Many people find it more hurtful to be accused of having poor intuition than of being slovenly, lazy or selfish”. He also shows us, through a number of social experiments, that more often than not, our intuition is wrong. So when you hear “Just follow your intuition and you`ll be fine”; that`s an irrational advice.

You are not a bad parent for not knowing what to do or for doing something that didn`t really work. Making mistakes and being confused is a big part of being a parent. I used to think I could be in tune with my instincts and my feelings and that would be all I needed as a parent. That was before I became a parent.

Scientific studies can help a lot. Don`t feel overwhelmed by them, there are a lot of people turning them into easy-to-understand articles and books, so we can make sense of them. Again, it doesn`t mean there is a formula. I`m not suggesting scientific parenting is a thing. You still have to make decisions based on your particular situation, but I believe in informed decisions. The more you know, the more confident you are as a parent. And that makes a big difference.

Using the same example as above, about babies who cry every time you put them down. My son was like that and it didn`t feel right to let him cry, but also, I needed to eat and do my own stuff, so my instincts were in conflict here. I didn`t know if I should let him cry a bit and if that would make him learn to be more independent or if I should always comfort him. Then I came across a bunch of studies – which are also mentioned in “Irrationality”, I later found out – showing that the more you leave a baby crying the more they cry. They will cry more often if they don`t feel safe, if you don`t pick them up when they call; they instinctively do it. So I figured there was no point fighting it. I picked my son up when he cried and that worked out for him and for me, as I didn`t have to hear him cry much. That`s also in attachment theory.

And if you think that`s overprotecting or spoiling a child, I must add that there`s no evidence whatsoever that ignoring a crying baby is good for them. You might still dispute me on that, but because scientific data is on my side, I`m confident on my decision, so I won`t feel bad about it. Informed decisions will make you happier, too.

Again, I must stress, it doesn`t mean we`ll always make the same decisions and that we`re acting right or wrong. Knowing the science behind attachment and child development just helps and, as a parent, I`ll use all the help I can get.

 

I ordered a couple of books I`ll link down below. I figured if my life became so much easier once I understood the very basics of attachment theory, then I ought to learn more.

 

 

Books I ordered:

Theories of Attachment

Science of Parenting

 

Books I recommend (they are not on attachment but helped me a lot):

Irrationality

Bad Science

Rir é o melhor remédio – a história de Beto Volpe

 

Imagem de vice.com

Imagem de vice.com

Envolto em escuridão, Beto pôde finalmente enxergar uma luz. O clarão se abria, ofuscando sua visão, até que ele a viu: a silhueta de uma mulher saía da luz e se aproximava dele. Conforme ela se aproximava, Beto conseguia distinguir seus traços. A moça era linda, sorridente e o observava fixamente. Beto não conseguia tirar os olhos dela, petrificado diante de sua beleza. Ela estava vestida de branco. Seria um anjo? Depois de tudo, afinal, ele iria para o céu, fora bem avaliado. Não havia fogo, não havia dor, não havia tristeza. Só aquela moça linda, um anjo, que se aproximava para guiá-lo ao pós-vida. Tanto sofrimento, tanta luta, chegava agora ao fim. A mulher agora estava bem próxima dele, ele a via nitidamente, mas não conseguia proferir uma só palavra. Havia uma áurea envolta dela, como se ela mesma emanasse luz. Quando estava bem perto de Beto, a moça finalmente falou.

– Acordou, Seu Luiz! Que bom! Sua mãe vai ficar feliz – disse a enfermeira.

Beto acordava de um coma que durara três dias. Aos poucos voltou a sentir as agulhas, o desconforto, fome, vontade de ir ao banheiro e uma irritação pulsante. Soltou um grito.

– Achei que estava tendo uma afterlife experience! MAS, NÃO! ESTOU NA MERDA AINDA!

Beto e a morte são tão íntimos que ele se sente à vontade para fazer piadas. Aos 52 anos, ele já passou por 23 cirurgias, três acidentes cerebrais, dois cânceres, duas próteses instaladas, cinco implantes e enfrenta tudo isso com bom humor e 26 pílulas diárias.

– Enquanto eu puder brincar com a morte, ela me deixa quieto – diz ele.

Para ter certeza que eu anotava o seu nome corretamente, ele o soletrou: “V” de velório; “O” de óbito; “L” de lápide; “P” de pêsames; e “E” de enterro. Beto Volpe. Luiz Alberto, mas todos o conhecem como Beto. Nascido em São Vicente, litoral de São Paulo, ele tem algumas certezas na vida. A primeira foi provavelmente o fato de ser gay. Sempre soube, desde criança. Era vítima frequente dos valentões quando pequeno:

– Eu era pequeninho, quatro olhos e fresquinho. Era feio e era inteligentinho, quer dizer, fodeu! Eu era aquele que vivia tomando cascudo.

De família católica, Beto ia todos os domingos à igreja com os pais, o que o deixava muito confuso. Aparentemente, estava rezando para os mesmos santos que o mandariam para o inferno. Quando chegava em casa e ligava a TV, assistia a impressões estereotipadas de homossexuais nos programas de comédia. Não se identificava com nada, vivia em um mundinho só seu, isolado. Até que, aos oito anos de idade, percebeu que não era o único. Empreendedor desde pequeno, Beto passou a montar clubinhos onde outros garotos “fresquinhos” podiam se reunir e se conhecer. Chegou a cobrar taxa de admissão e mensalidade, e o clubinho era um sucesso. Daí ao fim da adolescência, Beto teve sua fase mais sexualmente ativa.

Nascido em 1961, Beto sempre teve um pezinho na música.

– Naquela época, década de 60, se você era um garoto obediente você aprendia a tocar violão. Se você era uma peste, aprendia a tocar acordeom. Adivinha o que eu aprendi a tocar?

Além de tocar acordeom, Beto também adora cantar, e tem uma voz de derreter. A voz grave, dicção impecável, ele canta tão bem quanto fala.

Nos anos 1980, uma sombra pairava sobre a Baixada Santista. Reduto de uma grande comunidade gay na época, o litoral paulista foi foco de uma epidemia de Aids que se espalhava pela população jovem do mundo. Na época, Beto trabalhava para a Caixa Econômica Federal, em uma unidade próxima do Secraids, em Santos. A cidade foi considerada a capital mundial da Aids na época, e o Secraids era o principal local de atendimento e onde se podia fazer o teste de HIV. Assombrado pela possibilidade, Beto decidiu ir fazer o teste e descobrir de uma vez por todas, mas ele não foi discreto quanto à decisão.

– VOU FAZER O EXAME DE AIDS! – disse em voz alta conforme levantava de sua mesa na Caixa.

Os colegas cochichavam em tom de censura para que ele falasse baixo, e olhavam à volta para tentar identificar se algum cliente o havia escutado conforme ele caminhava para fora da agência. Foi de cabeça erguida e iniciou o exame com toda a coragem. Foi quando a agulha saiu de sua veia que ele travou.

– Aí começou todo o filme pornográfico da minha vida, desde os oito anos de idade, começou a passar na minha frente. Eu tinha feito muita coisa, tinha morado em São Paulo. Eu tinha aprontado horrores em São Paulo.

Por que tinha ido fazer o exame? Exame idiota. Era melhor não saber! Com certeza seria positivo, depois de tudo que fez. Quando o resultado chegou: negativo. Beto passou a usar camisinha regularmente, não passaria novamente por esse sufoco. Mas a Aids daria um jeito de encontrá-lo. Para tal, o pegou em seu momento de maior vulnerabilidade: no amor.

O conhecera em São Paulo e estava cada vez mais apaixonado. Não era uma dessas paixões passageiras, era amor de verdade. Eles viveriam juntos, envelheceriam juntos, era para ser. Quando o namorado se mudou para uma cidadezinha do Triângulo Mineiro, Beto concordou com um relacionamento à distância. Duas vezes ao mês, Beto viajava de ônibus durante doze horas para ver o amado, que fazia o mesmo em finais de semanas alternados. A camisinha havia saído da equação há muito tempo.

Em um final de semana em que não se veriam, Beto resolveu fazer uma surpresa e apareceu em Frutal para visitar o namorado, que ainda se encontrava na loja de produtos agrícolas onde trabalhava. A gerente, desconcertada, não conseguiu impedir que Beto o pegasse com outro nos fundos da loja. Por ironia ou por safadeza mesmo, era um moço que conhecera em São Vicente enquanto visitava o Beto. A briga foi feia, o namoro se desfez, mas não sem que a cidade toda ficasse sabendo. Voltou a São Vicente com a dor que só uma traição pode causar.

 

Mudando de hábitos

A assembleia do Sindicato dos Bancários estava lotada. Beto entrou carregado por dois colegas. Estava magérrimo, as olheiras se fundiam à bochecha afundada, parecia que não aguentaria muito tempo. Todos os olhares se voltaram para ele, assustados. As pessoas cochichavam, Beto não conseguia caminhar sozinho. Esse sonho o atormentou repetidas vezes. Beto acordava ensopado de suor, apavorado, o sonho parecia tão real. Foi ao Secraids novamente, mas já sabia qual seria o resultado do exame. Quando foi informado, estava calmo, só concordou.

– Está tudo bem mesmo com o senhor? Não vai fazer nenhuma besteira?

– Não, estou calmo.

Ligou para os parceiros anteriores, mas nunca mais falou com o ex.

Outra certeza na vida de Beto é a de que a maconha salvou sua vida. A fumou pela primeira vez aos quinze anos de idade e foi amor ao primeiro trago. Nunca mais parou. O HIV (vírus da Aids) ataca o sistema imunológico do paciente, diminuindo a contagem de células T no organismo. Essas células são responsáveis pela defesa do organismo e, portanto, são as infecções e doenças oportunistas as mais perigosas para esses pacientes. Com o sistema imunológico comprometido, fungos e bactérias que não afetariam facilmente uma pessoa saudável, se tornam o pior pesadelo do soropositivo. Uma das oportunistas mais comuns é a candidíase, ou o famoso “sapinho”. Beto desenvolveu candidíase esofágica e teve grande dificuldade para se alimentar.

Conforme explica Chris Conrad, autor de “Hemp: O uso nutricional e medicinal da maconha”, é de suma importância que pacientes com Aids se alimentem: “O corpo reage à invasão do HIV da mesma forma que reage a queimaduras, tumores ou cirurgias. Ele demanda nutrientes a mais e, se necessário, começa a transformar as proteínas armazenadas nos próprios músculos do corpo. Os pacientes são instruídos a comer o suficiente para evitar a perda de peso, que ocorre em 98% dos casos de HIV. Para compensar, eles devem consumir quase o dobro da quantidade de proteínas que um indivíduo saudável ingere. Muitas pessoas com Aids relatam que melhoraram o apetite e ganharam peso depois que começaram a fumar cannabis”.

Beto chegou a pesar 34 quilos. Um médico deu bronca em sua mãe para que parasse de implicar com o baseado do filho.

– Ou você para de implicar com o cigarro de maconha dele, que é a única coisa que abre o apetite e, principalmente, mantém a comida lá dentro, ou ele vai falecer – disse o médico, preocupado com o estado de Beto.

Todos os médicos apoiaram o consumo da canábis.

Com a baixa imunidade e a dificuldade para se alimentar, outras infecções se seguiram. Beto teve uma febre de 41 graus e foi coberto por toalhas mergulhadas em água gelada. Foi quando entrou em coma, foi aposentado pela Caixa, e a sua vida mudou drasticamente.

– Olha, se um dia eu parar em algum lugar para prestar contas do que eu fiz aqui na Terra, se isso realmente existir, e perguntarem: “Qual foi a melhor coisa que aconteceu na tua vida?”, “foi ter contraído HIV”. O Santo vai desmaiar, mas vou falar isso mesmo. Foi ali que me forçou a mudar de direção, mudar pensamento. Eu provavelmente seria uma bicha velha lá no guichê. Com grana, ia ter grana, tal, tudo… eu ia continuar como eu era. Nunca fui do mal, mas era meu carro, minha calça, meu isso. E com a Aids o meu olhar passou de dentro para fora. Se eu olhar para a sociedade que eu vivo, a comunidade que eu vivo… tudo isso… de longe foi a melhor coisa que já me aconteceu.

 

California dreaming

A cidade de São Francisco, na Califórnia, EUA, é famosa pela neblina, a arquitetura pitoresca, as ladeiras e os homossexuais. Em uma época de grande preconceito, a acolhedora cidade recebeu a comunidade gay de braços abertos. A partir dos anos 1960, bairros inteiros se tornaram redutos gays, como o Castro, que oferece lojas, cinemas, bares e restaurantes direcionados a esse público. A epidemia de Aids atingiu São Francisco de forma devastadora.

Nos anos 1970, pouco se sabia sobre a doença. Médicos travavam uma batalha para tentar compreender o vírus e buscar tratamentos. O ativista pró-canábis e autor americano, Chris Conrad, conta de sua casa em uma cidade próxima a São Francisco, o que fez com que pacientes de Aids se manifestassem localmente:

– As pessoas lá começaram a notar que os pacientes que fumavam maconha não estavam tão doentes quanto aqueles que não fumavam. Isso fez com que as pessoas percebessem que a canábis tinha, realmente, valor medicinal.

Os portadores de HIV, em especial a numerosa população homossexual, foram grandes ativistas e estavam entre os primeiros grupos a se manifestar a favor do uso medicinal da canábis. Dale Gieringer, de sua casa em Berkeley, Califórnia, onde trabalha como representante da NORML, associação a favor de mudanças nas leis de drogas que envolvem a canábis, explica que São Francisco foi a primeira cidade a aceitar o uso medicinal da canábis. Ativistas como Denis Peron entraram rapidamente em cena e começaram a agir.

– Denis operava um clube de compradores de canábis em São Francisco, onde ele vendia maconha abertamente para pacientes. Ele era muito próximo de Harvey Milk, que foi o primeiro supervisor (cargo político) gay da cidade de São Francisco. O que aconteceu foi que Harvey Milk foi assassinado e a política tomou um rumo de direita. Denis teve que fechar o clube. Mas, ele tinha um grande círculo de amigos na comunidade gay, já nos anos 80, que estava muito bem organizada politicamente, e interessada no uso da canábis, sobretudo para a perda de apetite – explica Dale.

Em 1991, Denis Peron organizou uma iniciativa para legalizar o uso medicinal da canábis em São Francisco, recebendo 80% de aprovação da população. Outras cidades seguiram o exemplo. Em 1996, o estado da Califórnia aprovou a proposta 215, em favor da liberação do uso medicinal, com mais votos do que os que elegeram o presidente Clinton no estado.

Ainda assim, a pesquisa científica acerca do tema era dificultada pelo Governo Federal. A única fonte de canábis para pesquisa nos Estados Unidos vem de uma fazenda do NIDA (National Institute of Drug Abuse), no Mississippi. O médico e pesquisador Donald Abrams, em entrevista concedida a Julie Holland para o livro “The Pot Book” (2010), conta que demorou vinte anos para conseguir aprovação para suas pesquisas envolvendo canábis e Aids. O NIDA só liberava canábis para pesquisas que procurassem os efeitos nocivos da planta, e não o medicinal. Quando finalmente conseguiu a autorização, os pacientes com Aids prontamente aceitaram participar das pesquisas.

Além de ajudar os pacientes a controlar a perda de peso, a canábis também ajuda a reduzir a dor neuropática, que atinge cerca de 60% dos portadores do vírus. Os estudos indicaram uma redução de 34% da dor neuropática, além de aliviar outros sintomas, como dores de cabeça, câimbras na perna e fadiga crônica. Os estudos de Abrams demonstraram a segurança da administração da canábis em pacientes tão fragilizados como os de Aids, que têm baixa imunidade. Isso abriu caminho para a aprovação de novas pesquisas com diferentes enfermidades. Contudo, ainda há poucos estudos em humanos.

Hoje, na Califórnia, pacientes que recebem prescrição médica para o tratamento com canábis recebem uma carteirinha. Com ela, pacientes podem se dirigir a dispensários especializados em maconha medicinal, onde encontram uma variedade de produtos. As variedades de canábis vêm com informações sobre a espécie (sativa, indica ou híbrida), o balanço entre canabinoides (tipicamente a quantidade de THC em relação ao CBD) e quais variedades são mais úteis para cada tipo de enfermidade. Nos dispensários também se encontram comestíveis, como doces contendo canábis, manteigas e óleos medicinais; além de cápsulas, cremes de aplicação tópica (na pele) e outros medicamentos.

A maioria dos médicos ainda não tem expertise em canábis. Poucos sabem quais variedades funcionam melhor para quais enfermidades ou quais métodos de consumo são mais recomendados, a quantidade de cada canabinoide, etc. Ferramentas têm sido criadas para preencher esse vazio, uma delas é a Universidade de Oaksterdam, em Oakland, na Califórnia; a única universidade do mundo especializada em canábis. O coordenador, Aseem Sappal, compara a situação a dar a chave do carro, mas não ensinar a pessoa a dirigir.

– Essa é a importância da universidade – diz ele – é o único lugar onde as pessoas podem aprender a cultivar, cuidar, usar e até lidar com pacientes. Você não pode abrir um dispensário e um cliente de 50 anos chegar para consumir canábis medicinal pela primeira vez e você simplesmente dizer: “Toma aqui”. Essas pessoas precisam de informação, saber o que é melhor e mais indicado para elas.

A universidade também oferece aulas de cultivo, culinária, direito, história, entre outros assuntos relevantes ao tema.

Outra ferramenta hoje disponível é o site e aplicativo (para Android e IOS) Leafly, que fornece informações diretas dos usuários sobre as diversas variedades de canábis. O Leafly oferece informações como o sabor, aroma, efeitos negativos e positivos, além de quais sintomas cada planta ajuda a aliviar e quais pacientes estão usando quais variedades. Essa pode ser uma ferramenta útil ao leigo, que não conhece outros pacientes com a mesma enfermidade se medicando com canábis. O Leafly, porém, se encontra somente em inglês. No Brasil, as coisas têm andado um pouco mais devagar.

 

Ativismo do monstro marinho

Beto iniciou seu trabalho social fundando a ONG Hipupiara. A lenda do Hipupiara é típica de São Vicente, e pode ser melhor contada nas palavras de Beto:

– Diz que em 1564 vivia aqui em São Vicente uma indiazinha muito bonitinha, muito gostosinha chamada Irecê. Irecê era escrava do Capitão Baltazar… “escrava”… mas, o coração e o corpinho dela pertenciam, na verdade, a Andirá. Andirá era um índio que tinha um tacape famosíssimo. “Ai, o tacape do Andirá!”. E todas as noites eles se encontravam ali onde é a ponte pênsil hoje.  Ele vinha de barco dos manguezais, eles se encontravam e o amor acontecia. Até que uma noite, no caminho, ela encontrou uma bruxa. Ela falou assim: “Irecê, você está fazendo uma coisa errada, os seres do mar vão lhe castigar”. E ela tomou um susto, mas logo se lembrou do tacape do Andirá e falou assim: “Desculpa, tá? Tô atrasada”. Aí em uma outra noite de lua, quando ela chega no local de encontro ela vê o barco e o remo do Andirá e nada do Andirá.  De repente, ela ouve um urro pavoroso: “Aaaaarg”. Ela: “Meu Deus! Uma drag queen!”. Ela olhou e não era uma drag queen, era o Hipupiara, que em tupi-guarani significa monstro marinho.

O monstro pode ter sido uma foca ou um leão marinho que se perdeu na correnteza e veio parar em São Vicente. Irecê, assustada, chamou o Capitão Baltazar, que matou o monstro e o expôs em praça pública durante três dias. A lenda diz que o monstro engoliu Andirá. Fazia muito tempo que um monstro não amedrontava São Vicente, até a Aids vir à tona. A ONG Hipupiara auxiliava qualquer pessoa que tivesse contraído o HIV e organizava grupos de ativistas para exigir os direitos dos pacientes.

A primeira bandeira que Beto levantou no ativismo foi a dos efeitos colaterais.

– Antes de ter fundado a ONG, eu já comecei a sentir muito efeito. Eu comecei a tomar o coquetel em 96. Em 97 eu já estava com o meu rosto todo afundado. Os membros afinados, aparecendo veia e tudo. Eu estava achando que estava saltando a veia, mas não era. Era a gordura. A gordura que recobre… todo mundo tem uma capa de gordura. Essa gordura aqui, eu sou zerinho.

Para preencher o rosto, Beto implantou polimetilmetacrilato, que é injetado na pele e absorvido pelo organismo. O rosto afundado desapareceu, dando lugar a bochechas volumosas e de aparência saudável. A sua autoestima aumentou e ele se sentiu mais confiante. Ao pensar em todas as pessoas que não podiam pagar por esse procedimento, decidiu que ele deveria ser de graça, entregue pelo SUS (Sistema Único de Saúde). E lá foi Beto até Brasília incomodar o Congresso.

O tema ainda era tabu, ninguém queria falar sobre Aids. Dificilmente uma sessão abria com esse tema, então Beto organizou uma estratégia para ser ouvido. Sempre que ele via uma mesa cheia, entrava na sala. Quando abria para debate, ele pedia para falar, não importando qual fosse o assunto a ser discutido:

– Olha, desculpa, eu não tenho nada a ver com o assunto, mas eu estou aqui falando dos efeitos colaterais do coquetel – dizia, sob olhares de censura.

Beto diz que o governo evitava tocar no assunto para não assustar as pessoas e elas deixarem de tomar o coquetel. Mas as conversinhas, papos entreouvidos, todas as incertezas sobre o que era culpa do HIV e o que era culpa do coquetel, assustavam os pacientes ainda mais. Não havia certeza sobre nada, não havia informação competente.

Finalmente, em 2004, a portaria saiu. O diretor da sessão no congresso puxou Beto de lado e falou:

– Eu vou falar na mesa daqui a pouco, mas quero que você seja o primeiro a saber. Vai ser assinada uma portaria na semana que vem colocando o preenchimento e outras coisas no SUS.

Conquistas como essa são as medalhas de Beto, que nunca pediu nada em troca de seu trabalho na ONG. Em 2007, o Supremo Tribunal Federal abriu uma sessão para que teses sobre medicamentos de alto custo fossem defendidas por especialistas e entidades. Duas das teses escritas e representadas pela ONG Hipupiara foram selecionadas.

– A Associação dos Magistrados do Brasil de um lado, o presidente do Conselho Federal de Medicina de outro e eu. Hipupiara lindo ali no meio – diz Beto.

Gilmar Mendes, que presidia a sessão, chamou Beto para apresentar sua tese:

– Ouviremos agora, o Dr. Luiz Alberto Volpe.

– Presidente, apenas uma breve correção, se você me permite, eu não sou doutor, não.

Ele já tinha entrado na justiça duas vezes para conseguir o medicamento que precisava. A vagarosidade burocrática da Anvisa e do SUS deixavam muitos pacientes na mão. Novos medicamentos apareciam, mas demoravam para ser aprovados no Brasil e, por serem medicamentos altamente controlados, que não podiam ser vendidos, eram distribuídos pelo SUS, que ora demorava com a papelada, ora não tinha o remédio.

Cida tivera o mesmo problema com o Frisium de Clárian. Quando o SUS não tinha o medicamento, ela tinha que se virar para comprá-lo, para que Clárian não morresse pela própria abstinência do remédio tarja preta. Os medicamentos para Aids, no entanto, não estavam disponíveis para venda. Se faltar, faltou. O paciente teria que entrar na justiça e depender da morosidade judiciária. Beto não podia mais deixar isso acontecer. Defendeu um sistema que acelerava o processo de aprovação e facilitava o acesso aos medicamentos. As teses foram acatadas pelo Tribunal.

Beto é possivelmente a única pessoa do mundo a ter sua própria ponta de fêmur guardada em casa, em um vidrinho de geleia, preservado em éter. Ao virar o vidrinho de um lado para o outro, é possível enxergar a parte de dentro necrosada, parte do efeito colateral da medicação. A parte externa do osso não é lisa e redonda como deveria ser, apresenta diversas superfícies e angulações, como uma bolinha de papel amassado. Conforme o osso se deteriorava por dentro, o peso do corpo o comprimia e deformava, causando dores – como ele mesmo diz, em tom de ironia – “deliciosas”.

– Esse ossinho já foi esfregado na cara de três ministros. É isso aqui que é efeito colateral! Não é vômito, não é caganeira! É isso! – conta Beto, e prossegue rindo após notar meus olhos arregalados – A cara que você fez agora é a mesma que eles faziam.

A maconha o ajudou a superar a dor óssea até que o osso fosse substituído por próteses. A recuperação da cirurgia também não foi fácil. Beto só conseguia dormir depois de um baseado. Beto participou como palestrante de um evento na USP sobre o uso medicinal da canábis. Ele falaria logo após um doutor californiano, que declarou que a única dor que a maconha não conseguia aliviar é a dor óssea.

– Gente, antes de eu falar, – começou Beto – eu não tenho doutorado nem nada, mas eu tenho que discordar do colega da Califórnia…

Beto acredita que a maconha tenha um efeito analgésico indireto também, distraindo o usuário da dor para que pare de pensar nela momentaneamente.

– A gente alimenta muito a dor, – diz ele – se você para de alimentar, de pensar nela, ela diminui.

 

Sessão de terapia

Beto chegou na Santa Casa de Santos para a sua primeira sessão de quimioterapia e se deparou com um ambiente extremamente depressivo. Os pacientes estavam todos quietos, vivendo suas próprias agonias, contemplando aquele momento de incerteza. Uma enfermeira se aproximou dele e perguntou:

– E quando é que o senhor vai querer cortar o cabelo, Seu Luiz?

– Ué? Precisa? Não cai tudo sozinho?

O paciente vizinho riu do comentário. Beto encontrou ali uma abertura. Ele passaria dez meses em tratamento, precisava melhorar o humor da sala. Puxou conversa com o senhor que deu risada, e não demorou muito para as piadas começarem.

– Diz que a ruiva… a gente não pode mais falar de loira, então vamos falar da ruiva… a ruiva encontrou uma amiga que fazia tempo que ela não via e falou: “Menina! Você está um espetáculo! Perdeu aqueles quilinhos a mais, está enxutinha! E esse cabelinho curtinho, super fashion! Tá fazendo o quê?”. A amiga respondeu: “Quimioterapia”. E a ruiva: “Jura? Na USP ou no Mackenzie?”.

Os pacientes a sua volta entreouviam e davam risadas animadas.

– Qual é o melô do câncer de mama? – Beto cantarolava – Saudosa eterna Clara Nunes; Era um peito só; Cheio de promessa…

Mulheres mastectomizadas passaram a rir também. Não demorou muito para Beto fazer amizade com todos os pacientes da sala. Uma enfermeira se aproximou por trás de Beto e cochichou:

– Senhor Luiz, você não deveria contar essas piadas para esse tipo de gente.

– Meu amor, esse tipo de gente é igual a você, só muda a cor da roupa. A qualquer momento você pode estar do lado de cá. No começo da tarde tinha uma doença oprimindo todo mundo, agora está todo mundo tirando sarro dela.

O câncer apareceu pela primeira vez em 2003, e estava na medula, no pescoço, no pulmão, no fígado, no baço, no retroperitônio e na virilha. Sua imunidade estava ótima, não se tratava de uma oportunista; e Beto é o primeiro a ter câncer na família. Ele suspeita que esse tenha sido mais um efeito colateral da medicação.

Ele ficou surpreso com a quantidade de mulheres fazendo quimioterapia, eram muito mais numerosas. A sua última sessão caiu no dia 8 de março de 2004, Dia Internacional das Mulheres. Beto chegou com um buquê de rosas, e distribuiu as flores entre as mulheres. Uma senhora bem velhinha, ao receber a rosa, debulhou em lágrimas. Beto se assustou, mas ela logo explicou:

– Filho, essa é a primeira flor que eu ganhei na minha vida.

Beto pensou na sorte que tinha. Ele tinha uma família que o apoiava, convênio médico amplo que cobria aquilo que o SUS não oferecia, uma condição de vida favorável, teve oportunidade de estudar. As pessoas o viam como um exemplo de superação, mas ele tinha tanto a seu favor. Aquela senhora se tornou um de seus ídolos.

– Eu pensei: que merda de vida que essa mulher teve! – diz ele – E ela está lá, brigando por ela. Esses são os meus ídolos.

 

“Não antes da minha mãe”

O segundo câncer foi descoberto em 2008, durante uma cirurgia de hemorroida. O câncer estava no reto, parte final do intestino, o que levou a mais cirurgias e tratamento com radioterapia. Apesar de os médicos afirmarem não haver sequelas permanentes, o tratamento acabou com a vida sexual passiva de Beto. Diferente da quimioterapia, que ocorre a cada quinze dias, a radioterapia era feita diariamente. Fazer amizade foi muito mais fácil, encontrando as mesmas pessoas todos os dias no mesmo horário. Logo, as tirações de sarro começaram no Hospital do Câncer em São Paulo.

Ao notar que os médicos andavam para lá e para cá de jaleco e estetoscópio, inclusive fora do hospital, Beto não pôde deixar de protestar essa atitude um tanto quanto arrogante. No dia seguinte, apareceu de jaleco e estetoscópio.

– Se esse cara leva coisas pro hospital, de fora para dentro… – explica Beto – Ou pior! Levar coisa de dentro, que está passando por tratamento, está resistente, para fora. E o pessoal faz desfile de jaleco e estetoscópio no barzinho da esquina, na Caixa Econômica, no ponto de ônibus.

Um médico se aproximou e indagou a razão por que Beto, um paciente, andava para lá e para cá de jaleco no hospital.

– Não sei, doutor, – respondeu – deve ter alguma coisa muito perigosa na região porque vocês não tiram isso por nada. Eu estou me protegendo também.

Foi com esse bom humor que Beto foi sobrevivendo a uma série de tratamentos, efeitos colaterais e doenças oportunistas. Ganhou dois apelidos dos médicos: Robocop (devido aos implantes) e Highlander (em homenagem ao personagem imortal dos filmes e séries de mesmo nome).

– Eles dizem que pacientes com HIV vivem em média onze anos. Eu enfio os outros quatorze onde? – diz Beto.

Uma das palavras que mais odeia é “terminal”. Todas as vezes que os médicos explicavam para sua mãe que ele estava terminal, a mãe dava broncas nos médicos. Beto não suporta a ideia de sua mãe ter que lidar com sua morte:

– Terminal você entende o quê? Que não tem mais jeito, acabou. Isso faz um estrago na cabeça da pessoa.

Depois que o irmão e o pai faleceram, Beto adotou um mantra: “Não antes da minha mãe”. Sempre que se encontra em um momento crítico no hospital, ou a caminho dele, recita para si mesmo a frase, repetidas vezes.

– Ninguém merece perder dois filhos, pelo amor de Deus!

Paulo nasceu quando Beto tinha onze anos. Apesar da diferença de idade, se davam bem. Beto já tinha Aids quando Paulo foi diagnosticado com transtorno bipolar.

– Após três tentativas, na quarta ele conseguiu – conta Beto, a expressão sombria – em 2005 ele se matou. A gente não se recuperou até hoje. A partir de então eu me proibi de morrer antes dos meus pais.

 

A terceira certeza

– O meu nome é Beto Volpe, tenho HIV, sou homossexual, usuário de drogas e sou respeitado por isso tudo.

Ele faz questão de ser direto e não esconder nada sempre que dá entrevistas. Se comporta da mesma forma em suas palestras. Ele começa com uma parte mais teórica sobre a Aids, sem entrar muito em números específicos, e depois passa para o seu depoimento. Sempre com muito humor, usa pantufas de pata de dinossauro e outros assessórios cômicos para animar o ambiente. Já foi parar em todos os estados e uma porção de cidades para palestrar, nunca cobrando nada, só pede ajuda com transporte e um lugar para ficar. Ele ensina que a positividade é o atributo mais importante de um indivíduo para se proteger das situações mais desafiadoras, e que pode salvar vidas.

A canábis pode ter contribuído muito no seu caso.

– Ela me desestressa, dá uma relaxada – explica – você dá risada. É um estado diferente, o riso fica mais fácil. Você percebe a realidade a sua volta de outra maneira, mais engraçada, mais profunda.

Ele aprendeu muito, e continua aprendendo. A cada palestra, um lugar novo, pessoas novas, novas experiências. Ele divide o que o HIV o ensinou e tenta dividir esse aprendizado com quem quiser ouvir.

– No fundo eu acho que o HIV veio mostrar para todo mundo qual é o jeito certo da gente fazer. Tem que fazer exercício físico regularmente, alimentação balanceada, viver de uma maneira saudável, positiva, não esquentar muito a cabeça com problema. E a gente está tendo que fazer isso.

Assim Beto tenta levar a vida, sempre tirando coisas boas de situações ruins. E a principal certeza de sua vida:

– Rir é o melhor remédio. Eu não tenho dúvida disso.

 

*Essa história faz parte do livro “Ervas Daninhas”.

** Beto Volpe é autor do livro “Morte e Vida Posithiva”. Clique aqui para saber mais!

Attachment

 

me and BruceFourteen months ago I became a mother. Nothing in my life has been quite so scary – and I`ve been through some scary shit (that involves being exposed to idiots with firearms, but I`ll leave that to another post). Every day is a constant battle where I desperately try not to screw up. It became a bit of an obsession.

As soon as I became pregnant, most of my decisions were based on what I thought would be best for my son. I lived in Sao Paulo, Brazil at the time and a flawed public health system, an abandoned education sector and a great deal of crime and violence – illustrated by a guy being shot dead by police outside my home – convinced me it would be best if we moved to the UK. And so we did. But moving half way across the globe is not enough. How about my child`s health?

I was a vegetarian my entire life, but only because my parents were. Of course I read enough about nutrition to be able to deflect people`s comments about not eating enough protein and all the other typical misconceptions, but I hadn`t really studied about the health implications of diet. So I got myself another little obsession and bought myself all the books available on that subject. I read them and what I could find online, took a couple of online nutrition courses and voila: I became a vegan. Convinced it was the healthiest diet and following guidelines to make sure he was getting all the nutrition he deserves, I am now raising my son as a vegan.

Go ahead and crucify me. But make sure you read all the literature on it first, it might change your mind.

Now all I had to do was to love him unconditionally and he would be safe, healthy and emotionally stable. Right? Well, that`s where I began to really struggle. I found myself in situations where I didn`t know what to do or what advice to take and started to really question my ability of parenting. For starters, I realised my husband didn`t really want to be a father. We split up and he doesn`t see my son all that much. He often says he`s coming over to see him, but then gives up and gives me a last minute excuse. My son is only 14 months old, so I`m not sure he realises what`s going on just yet. Nevertheless, I made my peace with the fact his father has this incredible power to break his heart in a million pieces and that I have to be there to help him pick them up. I understand is out of my control, but my son might get very disappointed and carry this scar with him for the rest of his life. All I can do is damage control.

My role is not only to try to protect my son from external harm, but to help him cope with the harm I can`t prevent. All this responsibility made me anxious – it still does – and my anxiety has led me to make a number of mistakes.

Loving my son doesn`t mean I am providing the most caring, nurturing environment I could provide; and it doesn`t mean I am making the best choices for his emotional needs. This is something I am still learning every day, but listening to Suzanne Zeedyk (please visit www.suzannezeedyk.com to learn more about her) at a training day lecture provided by the company I work for made me put the pieces together. It`s all in the attachment theory.

Zeedyk explains it in very simple language with a story that involves sabre-toothed tigers and teddy bears. Imagine pre-historical human beings using their instincts to survive from predators. If a sabre-toothed tiger attacked the group, it would likely go for the weakest, easiest pray: the babies. The babies can`t protect themselves or run away, but their parents can do that for them. So while adults have the instinct of running for their lives, babies have the instinct of getting the adult`s attention so they don`t get left behind. Babies cry and scream because they don`t want to be left alone, they want to be held and kept close. This attachment is key to their survival, so it`s the most fundamental part of their nature. When they don`t have that, all it`s left is fear – which can mean trauma, anxiety and a range of emotional issues.

To make it clear, Zeedyk describes an internal teddy bear. A child uses a teddy for comfort, and little by little they develop their own internal teddy bears they turn to for comfort in moments of distress; that`s them building resilience. But this can only happen properly if they had this comfort in their early childhood provided by their parents (or whatever caring figures they had) in the form of attachment.

I was trying my hardest not to cry during the lecture, but at some point I couldn`t hold it anymore. It all made sense, but it was hard to digest. If I had this information before, my life as a parent would have been a lot easier. I remembered my attempts on weaning my son out of the breast and realised how silly I was. He wasn`t ready, and he showed that by desperately crying, asking for comfort. It felt completely against my instincts so I eventually gave up and gave him the breast. I decided not to force this on him and let him take his own pace; and that made my life easier even though it took some sacrifice on my part. He only sleeps while breastfeeding, and he wakes up twice for a feed during the night: about two hours after he went to bed and two hours before he gets up. That means I can`t go out at night, ask for somebody to babysit or sometimes even watch a movie. It also means that he sleeps on my bed.

He moves a lot during the night and at some point he started falling off the bed, even after I installed a bed guard. That freaked me out. I didn`t want him to hurt himself and the only solution I could think of was making him sleep on a cot by himself. A lot of friends and family tried to convince me to use cry-it-out methods to get him to sleep on his own. I often heard: “you have to do it”; and insinuations that I was being a pussy for not doing it already. I was convinced it was the only solution, but I felt physically ill thinking about it. I was so nervous and so anxious I nearly vomited.

The only other solution I came up with was to dismantle my whole bed and put the mattress on the ground so my son wouldn`t hurt himself if he fell out of bed. But it sounded like a radical idea. I was under the impression I had to discipline my son to conform and that making changes where I had to accommodate were signs of weakness, of spoiling my child. The nice parents of a Facebook group called “UK Breastfeeding and Parenting Support” were the ones who changed my mind. I posted asking for advice and once they told me putting a mattress on the ground wasn`t nearly as radical as letting a baby cry himself to sleep – for hours, at least three nights in a row, – I had to agree with them. So now we sleep on a Japanese style bed and my son still has the breast during the night as much as he needs. I stopped breastfeeding during the day as he wasn`t too bothered by it. So it`s not like I don`t have any control over it, I`m just adapting to my child`s needs and not pushing too hard towards something he`s not ready for.

The last few days, my son seems to have developed an awareness that water can be dangerous. Though he has always loved baths, he suddenly feared them, triggered by no particular event. I tried to get him to sit in his bathtub as he normally did and he cried, started shaking, his eyes were wide open – he was clearly in fear. The next day I tried giving him a shower and it was even worse. After today`s lecture, I decided a new approach. I sat in the bathtub and got him slowly in with me, keeping him close the whole time, as reassuring as I could. He was tense but didn`t cry, and was slowly feeling more comfortable, sitting down and playing with the bath time toys. I`m hoping I only have to do it a few more times before he feels safe in the water again, but he can take the time he needs.

Day by day I`m learning these little tricks to make my child feel safe, loved, connected. He needs to know I`m listening, I`m paying attention and I`m there for him. This is not about spoiling him, it`s about building resilience. As pointed out by Suzanne Zeedyk, the science says otherwise: children who have had good emotional attachments grow up to be more confident, loving adults. I want my son to be able to count on his own internal teddy bear when I`m not around.

I hope other parents (and everybody else, really) learn about attachment faster than I did. So please check out Zeedyk`s website and blog, they`re worth a visit:

www.suzannezeedyk.com

www.suzannezeedyk.com/blog

Clárian e a Canábis

Clárian CarvalhoA tela em branco do Google: tudo sempre começava por ali. A cada busca uma nova jornada por respostas. Ela precisava saber, entender o que afligia sua filha; o que outros fizeram; quais eram os tratamentos experimentais. O que os médicos recomendavam; o que os pais recomendavam? Degenerativo? Como retardar o progresso da doença? Neurológico? Raro? Poucas opções. Poucos sobreviventes. O que fizeram os sobreviventes? Alternativas? Falsos positivos? Exames diagnósticos?

Foram dez anos assim, sem diagnóstico. A cada suspeita, uma busca. A cada busca, um desespero. Um médico chegou a ameaçar:

– Se você não parar de ir procurar no Google, eu não vou mais te falar quais são as suspeitas.

Não tinha jeito. Maria Aparecida, mais conhecida como Cidinha, – mas que por razões de praticidade a chamo de Cida – não conseguia se segurar. Precisava saber o que fazer, como agir. Ela delineava os próximos passos em sua mente, enquanto fazia as pesquisas. Trazia os resultados para os médicos, pedia opiniões e sugestões. Por vezes, chegava aos prantos no consultório, assustada com o que havia encontrado. A frase mais comum: “Não tem cura”. Foi a Dra. Maria Teresa Chamma que desconfiou da verdadeira doença pela primeira vez. E lá foi a Cida sentar em frente ao Google.

Síndrome de Dravet, digitou. Os resultados não eram nada promissores. Em meio ao caos de informações, textos científicos, notícias, imagens na cor roxa, grupos de pacientes e soluços, Cida encontrou a Charlotte. O artigo da CNN estava em inglês, mas Cida identificou a palavra Dravet e decidiu jogar o texto no Google Tradutor. Conforme lia o texto traduzido palavra por palavra, ao pé da letra, de difícil compreensão, mas razoavelmente inteligível, Cida começou a sentir seu coração palpitar. Tratava-se de uma animação que não sentia há tempos. Voltou ao artigo, um vídeo acompanhava a matéria. O vídeo era simples, um “antes e depois” bem ilustrativo. A Charlotte antes da canábis era uma garotinha letárgica, convulsionando a cada 25 minutos, chorando, mas sem conseguir falar ou andar. O olhar da menina de quatro anos não acompanhava nada, ela era um casco vazio, quase um fantasma. A Charlotte atual era outra pessoa, o vídeo a mostrava andando de bicicleta (com rodinhas, é claro). Cida sentiu a esperança explodir dentro de si. Havia uma chance de salvar a Clárian.

 

– A Clárian era um bebê muito bonzinho – disse Cida, sentada a uma mesa do Starbucks – ela estava sempre sorrindo.

A mesa ficava em um corredor do shopping Tatuapé, na zona leste de São Paulo. Evandro, filho mais velho de Cida, levara Clárian para almoçar enquanto Cida e eu conversávamos.

– A única coisa que eu percebi antes de ela ter a primeira crise, foi que eu fazia assim para ela no berço – Cida moveu os braços como se fosse pegar um bebê – e ela olhava para uma mão, olhava para a outra, e não levantava os bracinhos.

Ao comentar com o pediatra, o médico não achou estranha a reação de Clárian.

– Cada bebê se desenvolve de um jeito – dizia.

Aos cinco meses de idade, no entanto, Clárian teve sua primeira gripe. O instinto de mãe fez com que Cida trouxesse a Clárian para dormir com ela.

– Eu fiquei com dó de deixar ela dormir no berço – diz ela.

Cida é bancária e trabalhava no Bank Boston, hoje Banco Itaú. A licença maternidade havia terminado e ela queria ficar mais com a filha quando estivesse em casa. Já em seu quarto, Cida percebeu que a temperatura da Clárian estava subindo. Preocupada com a febre do bebê, resolveu levá-la para a sala, onde seu marido, Fábio, assistia à televisão. Sob a iluminação da sala de estar, Cida notou um movimento estranho nos olhos da filha.

– O olhinho dela ficou assim: pra lá e pra cá, pra lá e pra cá – diz Cida – eu nem imaginava que aquilo era uma convulsão.

O desespero começou quando os lábios de Clárian começaram a roxear. Enquanto Fábio fazia respiração boca a boca, Cida pegava Evandro, então com nove anos, em seu quarto. Correram todos ao pronto-socorro. A médica não disse nada, pegou o bebê e a levou correndo para dentro. Clárian estava tendo uma parada respiratória.

– Não tenho nem palavras para descrever como foi para nós – diz Cida, entre um soluço e outro – ela não conseguiu nem pegar a veia dela, porque o acesso dela é muito difícil. Quando ela voltou, e demorou muito para ela voltar, a Clárian estava com uma agulha bem grossa no osso da perna. Foi o único acesso que conseguiram, o acesso no osso. Eu fiquei muito impressionada com tudo aquilo. Ela precisava de UTI urgente e lá não tinha UTI.

Ficaram então, pai, mãe e irmão aguardando uma ambulância, mas a ambulância não veio. Todas as que são equipadas para UTI estavam ocupadas e Clárian não poderia ser transferida em uma ambulância qualquer. Aguardaram e continuaram aguardando, até que, pela manhã, Cida ligou para a chefe, para avisar que não poderia ir trabalhar. Explicou o que estava acontecendo e, para o seu alívio, enviaram uma ambulância do banco, pertencente ao corpo de bombeiros, para transferir a Clárian. A ambulância estava devidamente equipada e chegou rapidamente, levando a família para o hospital São Luís.

No caminho, Clárian teve outra crise, seguida de uma parada respiratória. Uma crise atrás da outra, médico atrás de médico. Nada parecia ajudar. Os médicos declararam que ela não iria resistir. E assim foi, nos próximos dez anos. A cada crise severa uma corrida ao hospital; a cada internação as más notícias: “Você tem que se preparar”, “ela não vai resistir”, “ela não vai andar”, “ela não vai falar”. Os médicos sempre vinham acompanhados de um psicólogo, que estava lá com a única função de preparar os pais para a morte da filha. Aos dez anos de idade, Clárian passara por dezessete internações (os pais só contam as internações de mais de vinte dias, já não sabem mais por quantas internações mais curtas ela passou), sete em UTI, onze pneumonias, três paradas respiratórias. A cada visita ao hospital, Cida era preparada para a morte iminente da filha, sem que os médicos soubessem explicar o que ela tinha. Depois das primeiras vezes, Cida desistiu de responder ao psicólogo. Apenas concordava, mas tinha uma resposta pronta em sua mente:

– Não! Algum jeito tem que ter! Eu não vou ficar parada – ela pensava.

Para tentar descobrir o que Clárian tinha, foram feitos muitos exames. Para compreender o motivo para sua hipotonia (problema para controlar a temperatura do corpo), foi feita uma biópsia do músculo do braço – em que parte do músculo é removida para análise – que deixou uma cicatriz. Clárian também passou por inúmeras máquinas de ressonância; raio x; aparelhos que dão choque para ver como o músculo reage; exames de sangue; exames de urina; exames de todos os tipos.

O desenvolvimento de Clárian foi lento e os medicamentos a deixavam dopada. Ela precisou de fisioterapia para conseguir sustentar sua cabeça e poder sentar, depois para engatinhar e assim por diante. Quando começou a ir para a escola, teve dificuldades para se concentrar.

– O topiramato tira muito a concentração. A Dra. Teresa nem quer aumentar mais a dose porque ela já tem um atraso na escola. Você percebe que ela tem um atraso cognitivo – explica Cida.

Diversos medicamentos foram experimentados para ver qual se adaptava mais à condição da Clárian. Sem diagnóstico, era uma questão de controlar as convulsões e ver o que a ajudava. Encontrar uma dosagem também não era fácil, pois era necessário encontrar um equilíbrio entre os efeitos benéficos e os efeitos colaterais. Um medicamento chamado Trilepital acabou desencadeando ainda mais crises generalizadas em Clárian. O depakene, um anticonvulsivante, teve que ser substituído ao danificar os rins de Clárian; por pouco ela não teve que passar por hemodiálise. Outros efeitos assustavam Cida de tempos em tempos. Uma vez, quando estava trabalhando, recebeu uma ligação da escola:

– A gente não sabe o que está acontecendo com a Clárian. Ela não está andando.

Cida correu para a escola e levou Clárian ao hospital. A sua cabeça se enchia com as possíveis doenças degenerativas. Estaria Clárian perdendo movimentos?

– Ela não parava em pé, ficava mole – diz ela.

Depois de uma série de exames, a resposta: Clárian estava simplesmente dopada. O medicamento foi retirado do tratamento e ela voltou a andar. As convulsões, no entanto, continuavam ocorrendo com frequência, até dezessete por dia. Quando a Dra. Teresa suspeitou que fosse síndrome de Dravet, recomendou um medicamento que não estava autorizado pela Anvisa, o keppra. Os pais de Clárian tiveram que importar o remédio sem receita por, digamos, rotas alternativas. Deu certo: as crises diminuíram.

Clárian passou a tomar o keppra duas vezes ao dia; frisium, uma vez por dia; gardenal, também uma vez; e o topiramato, duas vezes ao dia. São medicamentos pesados, controlados e caros, mas diminuíram as crises para uma a cada dez dias. Clárian estava melhor do que nunca (mais tarde, no entanto, as convulsões aumentaram novamente para cerca de 15 por mês). Agora, restava o diagnóstico. Um exame genético era necessário, mas ele não existia no Brasil. A Dra. Teresa, mais uma vez, apareceu com uma solução:

– Ela ficou sabendo de uma amiga dela, que estava fazendo uma tese de doutorado na Unicamp sobre o Dravet, – conta Cida – então ela nos indicou.

 

Até que ponto?

A família Carvalho foi de carro até Campinas fazer os exames, onde o sangue foi recolhido tanto de Clárian quanto dos pais. O estudo precisava de 200 voluntários que, como eles, teriam material genético colhido para análise. A família foi informada que os resultados demorariam a sair, já que o estudo precisava atingir o número pretendido de voluntários e dependia de verbas. Mais uma vez, os Carvalho aguardaram, pacientemente. Dois anos depois, no entanto, as crises de Clárian começaram a se intensificar. Clárian demorava muito para se recuperar das convulsões, que se tornavam cada vez mais severas. Por vezes, as contrações musculares em suas pernas eram tão fortes que elas alcançavam a cabeça. A paciência de Cida começou a se esgotar. Cada vez com mais frequência, Cida ligava para o setor de pesquisas da Unicamp, perguntando sobre o resultado do estudo.

– Ainda está em andamento – respondiam.

Nesses dois anos, Cida não parou de pesquisar sobre o Dravet. Ela já havia mandado o artigo sobre a Charlotte para a Dra. Teresa e perguntou se podia continuar enviando o que encontrasse. A neurologista concordou e Cida enchia o inbox de seu Facebook com artigos científicos e outras informações sobre o uso da canábis no tratamento da Síndrome de Dravet. Convencida da evidência, a Dra. Teresa declarou em uma das consultas da Clárian que viajaria aos Estados Unidos, para uma conferência sobre o uso medicinal da canábis. Emocionada, Cida abraçou a médica.

– Quando eu voltar, na mesma semana eu quero ver a Clárian – a médica pediu.

Cida continuou tentando ligar para a Unicamp, sem obter novidades. Em sua próxima consulta com a Dra. Teresa, Cida suplicou:

– Doutora, por favor, me ajuda. Tenta falar com a sua amiga.

Teresa se dispôs a ajudar, mas não conseguiu:

– Ela não está mais fazendo a tese, saiu. Eu perguntei e ela disse que não estava mais lá, não tinha mais acesso – disse.

Em uma de suas passagens pelo hospital, conversando com uma enfermeira, Cida conseguiu uma informação. A enfermeira disse conhecer uma moça chamada Camila, que trabalhava com a Dra. Iscia, que fazia parte da pesquisa. Cida pediu o contato dela e conseguiu um e-mail. A resposta finalmente veio: a investigação estava concluída e bastava aguardar em uma fila para receber o resultado dos exames. Quanto tempo? Ninguém sabia dizer. Mais uma vez a família aguardou. O próximo contato de Cida não foi tão amigável:

– Mas, espera aí! A minha filha está tendo crises! Nós nos prontificamos a levá-la, colhemos sangue. Eu só preciso saber: sim ou não! É só o que eu preciso.

– Não dá. Nós não damos a resposta assim, tem uma fila. A senhora precisa aguardar.

Era junho de 2013. O aumento de vinte centavos na tarifa do ônibus havia irrompido protestos no país inteiro. Imagens de cidadãos sendo atacados com gás lacrimogênio e jornalistas sendo atingidos por balas de borracha enfureceram a população. Logo, milhões estavam nas ruas. A avenida Paulista ora parecia uma grande festa, ora um campo de batalha. Sentindo-se abandonada e desprezada por aqueles que a deveriam ajudar, Cida só queria se juntar à multidão, gritar de raiva, mostrar a sua insatisfação. Em uma quinta-feira de protestos, ela estava decidida a engrossar o mar de pessoas que marcharia pelo centro da cidade.

– Eu estava de saco cheio! – afirma Cida, lembrando-se do telefonema que fez do escritório naquele dia.

Decidida a tomar as rédeas da situação, Cida ligou para o Genoma e pediu informações sobre como fazer o teste diagnóstico pago para síndrome de Dravet, que na época já estava disponível. Ela sabia que não sairia barato e que talvez demorasse, mas não podia mais esperar pela pesquisa, precisava de um plano de tratamento para a Clárian.

– O teste demora um mês para sair e o preço é quinze mil reais – disse a voz do outro lado do telefone.

Quinze mil reais. Cida desligou o telefone, caminhou até sua mesa, sentou, apoiou o rosto nas mãos e caiu aos prantos. Precisou ser acudida pelos colegas de trabalho, sua pressão sanguínea subira e ela estava em pânico. Ela não tinha quinze mil reais e, devido aos problemas financeiros que enfrentava, não podia fazer um empréstimo, pois já estava endividada. Desprovida de forças, não conseguiu ir à manifestação.

Nos próximos meses, Cida e Fábio se dedicaram a encontrar formas de quitar as dívidas e conseguir um empréstimo. Na pressa, contudo, acabaram ainda mais endividados.

– Tudo que você faz sem pensar – explica Cida – você quer atingir um objetivo e acaba se dando mal. Eu me dei mal financeiramente, mais ainda. Estou me recuperando agora.

Sentindo-se em um beco sem saída, Cida continuou ligando para a Dra. Iscia, atrás de respostas. Ela ligava para o centro de pesquisas e pedia pela doutora, mas sempre diziam que ela não estava. Cida perguntava quando ela estaria, para que retornasse a ligação, e sempre que recebia uma data ou um horário, ela retornava. No entanto, a resposta era a mesma: “Ela não está”. Até que, algumas semanas antes do Natal, Cida recebeu a informação de que a Dra. Iscia estaria presente, à uma hora da tarde, com toda a certeza. Cida ligou às 13h; ligou às 13h15; ligou às 13h30; ligou às 13h45 e ela não estava. Ligou novamente às 14h15 e recebeu uma resposta definitiva:

– Olha, ela não veio.

– Como assim? Ela não está, não está e agora não veio? – indagou Cida, já pronta para desabafar – Agora você vai me ouvir!

Cida jogou toda sua angústia no funcionário ao telefone, contou tudo o que estava acontecendo com a Clárian, sobre as crises, as dificuldades, as dúvidas. Contou que sua saúde também não era mais a mesma. A cada crise de Clárian, Cida sofria junto com a filha, sua mão fechava apertada até as unhas encravarem na palma da mão, enquanto ela tremia de medo. Cida sentia o corpo todo doer depois que as crises passavam, de tão tensa que estava. Fábio diz que Cida convulsiona junto com a Clárian. Ela suplicava por ajuda:

– Por favor, você vai ter que me ajudar. Eu não estou te pedindo, eu estou suplicando. Você tem noção do que é isso? Ela só precisa disso, para a médica dela correr atrás de um remédio mais potente.

– Tá bom – o atendente não conseguiu mais negar ajuda – espera só um pouquinho.

Em instantes, outra voz apareceu na linha.

– Pois não – disse a Dra. Iscia.

Já mais calma, Cida começou a explicar o que tinha dito ao atendente. A médica a escutou, pacientemente.

– Eu não posso ficar nessa fila, porque as crises da minha filha não podem esperar.

– Eu não posso fazer nada, você tem que esperar a fila – disse a doutora, calma.

– Eu não posso esperar a fila! Eu não posso esperar! – Cida se controlava para não aumentar o tom de voz, sua voz saía como um grito abafado – Eu tentei pagar particular, mas não consigo, são quinze mil reais.

– Eu sei que é esse valor. É por isso que a gente está desenvolvendo essa pesquisa aqui na Unicamp.

– Então, por favor, me ajuda! Eu não estou pedindo um quebra-galho, é a vida da minha filha!

– Eu vou tentar fazer alguma coisa por você. Você pode vir aqui, ou eu falo com a sua neurologista.

– Eu vou agora, se você quiser.

– É melhor eu falar com a neuro, pede para ela me mandar um e-mail.

– Você vai responder mesmo? – desconfiou Cida.

– Vou.

Até hoje, Cida não sabe para que servia a tal da fila, mas a resposta finalmente veio. Na mesma semana em que Maria Teresa voltava dos Estados Unidos, Cida levou Clárian para uma consulta. Era dia 20 de dezembro, mas Cida sentiu como se o Natal já tivesse chegado. Ela recebeu o diagnóstico da filha e uma notícia que renovou suas esperanças:

– Eu fiquei de boca aberta, Cidinha – disse Teresa, satisfeita – as crianças com síndrome de Dravet tratadas com canábis estão ótimas. Ótimas! Eu não estou nem aí para o que vão pensar, o que vão falar. Eu vou levantar a bandeira da canábis junto com você. Nós vamos atrás disso e eu vou te ajudar.

As lágrimas escorriam pelo rosto de Cida enquanto ela agradecia a médica repetidamente. A esperança novamente se acendeu dentro dela; havia onde se apoiar, alguém com quem contar. Cida não podia estar mais feliz.

 

A canábis

Agora que tinha um diagnóstico, Cida podia contar aos médicos, quando levava Clárian ao hospital, exatamente o que ela tinha. No entanto, isso não parecia ajudar.

Família de Clárian na Marcha da Maconha em São Paulo.

Família de Clárian na Marcha da Maconha em São Paulo.

– Dra.. o quê? – perguntavam os médicos.

A situação logo mudou. A revista Super Interessante publicou uma edição especial sobre a canábis, na qual o principal artigo tratava do uso medicinal. Em março de 2014, a matéria sobre o caso de Any Fischer, menina de quatro anos com epilepsia refratária que foi tratada com sucesso usando óleo de cânhamo em Brasília, desencadeou uma mudança radical no comportamento da imprensa. No segundo semestre de 2013, a revista Veja havia publicado uma longa matéria sobre os malefícios da canábis, sem fazer qualquer menção a possíveis benefícios. Mesmo os artigos sobre casos do uso medicinal salientavam os efeitos negativos da planta. Na mesma época, contudo, o documentário “Weed”, de Sanjay Gupta, médico consultor da CNN, que tinha Charlotte Figi como protagonista, havia sido lançado. Ao ser disponibilizado no Youtube, o documentário atingiu o mundo todo e, em um esforço conjunto de ativistas, legendas foram adicionadas em dezenas de idiomas. Em 2014, quando muitos médicos mal conheciam a doença, o mundo começava a aprender a pronunciar a palavra “Dravet”.

Diversos casos começaram a aparecer na mídia brasileira. Em abril, quase todos os veículos traziam novidades sobre o uso medicinal da canábis. A planta parecia recém-descoberta, uma novidade científica. O vídeo “Ilegal”, da campanha Repense (iniciativa de Tarso Araújo, a campanha visa defender o uso medicinal da canábis e informar a população sobre o assunto) sobre o caso de Any, foi lançado no Youtube e se tornou viral. Os dramáticos casos de epilepsia se destacavam constantemente nos jornais, revistas e noticiários televisivos, até que, finalmente, Katiele Fischer (mãe de Any) apareceu no Fantástico. Depois disso, não demorou muito para que ela conseguisse uma autorização especial para a importação do óleo de cânhamo.

O cânhamo é um tipo de canábis comumente usado na produção de fibra vegetal. A planta cresce até seis metros de altura, e tem uma concentração mais baixa de canabinoides. O governo americano aprovou a produção de extrato de canábis que fosse feito com cânhamo, com no máximo 0,6% de THC, uma quantidade muito baixa, que não dá barato. Como há pouco dos outros canabinoides também, para obter o CBD, os produtores espremem uma grande quantidade da planta até conseguir um óleo que possa ser usado como medicamento. E assim surgiu o RSHO (Real Scientific Hemp Oil), da empresa HempMed. A Anvisa passou a autorizar a importação desse óleo para as mães que provavam na justiça que seus filhos não respondiam a nenhum outro tratamento disponível.

Sob forte pressão da mídia, a Anvisa abriu um canal por onde pais pudessem enviar a documentação de seus filhos e adquirir autorização para importar o medicamento. A burocracia, claro, era enorme e a autorização demorava a chegar. Diversos pais tentavam fazer essa importação de forma ilegal, para ao menos saber se o tratamento funcionaria com seus filhos, antes de passar por toda a burocracia da Anvisa. Foi o que fez a família Carvalho.

Um amigo da família viajaria a Miami. Cida comprou o medicamento online e pediu que a entrega fosse feita no hotel em que o amigo estaria hospedado. Ele enfiou o óleo na mala e o contrabandeou ao Brasil com sucesso. A chegada do óleo coincidiu com a Marcha da Maconha em São Paulo, no dia 26 de abril de 2014. Cida havia perdido a chance de acompanhar as manifestações do ano anterior, mas não perderia dessa vez.

Às 4h20 da tarde de sábado, a marcha iniciou a caminhada. A concentração havia sido no vão do Masp; a multidão caminhou em direção ao centro, descendo a Rua Augusta e, em seguida, a Rua da Consolação, terminando o trajeto na Praça Roosevelt. A Polícia Militar afirma que havia três mil pessoas acompanhando a marcha, enquanto o coletivo Marcha da Maconha declara que havia mais de dez mil. A linha de frente era formada pelo bloco de usuários medicinais. Segurando cartazes e faixas, Cida e Fábio seguiam acompanhados do farmacêutico Paulo Orlandi-Mattos, da Unifesp, o professor e pesquisador de história da USP (Universidade de São Paulo), Henrique Carneiro, Maria Antonia Goulart, entre outros pacientes e ativistas. A família Carvalho foi toda recrutada para participar, vestindo camisetas estampadas com a cruz vermelha sendo completada por uma folha de canábis, e uma borboleta lilás, que representa a síndrome de Dravet. Até mesmo a Clárian participou da concentração, mas não acompanhou a marcha para evitar grandes aglomerados de pessoas, que podem desencadear crises.

Cida encontrou outras mães de crianças com epilepsia, como a Ariane Maldonado, cujo filho recém-nascido se encontrava internado no Hospital Alvorada, sofrendo crises graves. Ariane vestia uma camiseta estampada com a foto do bebê, Leonardo, acompanhada da frase: “O Leonardo também tem direito ao CBD”. Na Marcha da Maconha de 2014, pela primeira vez, não houve confronto com a polícia.

Mais tarde, após a marcha, Clárian tomou as gotinhas do óleo de canábis rico em CBD pela primeira vez. Nos próximos 13 dias, a Clárian não teria crises. Para ter uma visão clara da eficácia do produto, Cida e Fábio montaram uma tabela, anotando o número de crises e qualquer outro efeito que notassem em Clárian. Em abril, Clárian teve doze crises; em maio, sete; em junho, três crises; em julho, Clárian teve uma crise, e os espasmos haviam diminuído em 90%. Pela primeira vez, Cida notou que Clárian estava suando: ela conseguia controlar melhor a temperatura corporal. Ela não mais ficava sentada o tempo todo, com o olhar vazio; ela estava mais esperta, brincava mais, até dançava e cantava, algo que nunca fazia. Na escola, Clárian começou a copiar palavras da lousa. O medicamento, de fato, funcionava. O único efeito colateral claro era a sonolência, devido ao efeito sedativo do CBD. Cida também notou que nas duas primeiras semanas Clárian ficou um pouco agressiva, mas esse efeito passou.

O problema, no entanto, além de receber autorização da Anvisa, era arcar com os custos de importação do óleo.

– A princípio, ele sai US$500 você trazendo ilegal. Cada seringuinha daquela é US$500. Minha filha tem 11 anos; pelo peso, altura, isso e aquilo, precisava de três seringuinhas daquela. Então, isso ia passar a US$1.500. Se eu transformar isso em reais, com toda a burocracia que me foi pedida pela Anvisa… tudo bem, consegui a receita, a prescrição. De tudo o que pediram eu fui atrás, mas isso aí ia se tornar R$8.700 – explica Fábio.

Não podendo arcar com os custos, mais uma vez, a família Carvalho não sabia o que fazer para dar continuidade ao tratamento de Clárian.

Em linhas tortas

A canábis é o que se costuma chamar de “mato”. Ela cresce rapidamente e em qualquer lugar, quase qualquer clima. O óleo também pode ser facilmente fabricado, em casa, sem muitas complicações. É claro que é necessária uma certa prática para se produzir um óleo de qualidade e manter os canabinoides preservados, mas é uma alternativa para quem não pode comprar o óleo pronto. Cida e Fábio passaram a defender a liberação do cultivo de canábis para fins medicinais.

No entanto, o discurso da mídia foi se moldando no decorrer de 2014, quando a palavra “maconha” passou a ser substituída por “CBD”. Os termos mais comuns eram “derivado da maconha”, “uma das mais de 400 substâncias presentes na maconha”, “extrato de CBD”, “óleo de CBD”. A mensagem foi se modificando e a impressão que se tinha era de que se podia extrair o CBD e descartar o resto, que somente o canabidiol possuía valor medicinal, sem o risco do nefasto THC. A ideia foi toda simplificada: o CBD é bom e a canábis continua sendo ruim, má. A mídia parecia ignorar o fato de que a maior parte das pesquisas científicas havia identificado valor terapêutico no THC, para diversas enfermidades. Além disso, o óleo que as mães brasileiras estavam usando para medicar os filhos continha uma variedade de outros canabinoides e terpenos, substâncias presentes em qualquer planta de canábis.

Jason explica que o CBD isolado não é eficaz para todos os casos. É preciso verificar caso a caso qual é o melhor equilíbrio entre os canabinoides. No caso de Jayden, a planta Charlotte`s Web – cepa nomeada em homenagem à garotinha Charlotte, que possui apenas 1% de THC – não funciona. Jayden usa variedades com uma concentração um pouco maior de THC. No entanto, para Charlotte, a sua planta funciona perfeitamente. Pais preocupados em causar “barato” nos filhos acabaram se posicionando contra, no entanto, a liberação de THC. Outros, preocupados com o risco de abuso, se posicionaram contra o cultivo, e preferem comprar um medicamento produzido pela indústria farmacêutica. Outros, como é o caso de Cida e Fábio, acreditam que o cultivo seja a melhor solução, já que muitas famílias não poderiam pagar por medicamentos industrializados.

A essa altura, os pais de Clárian já estavam em contato com centenas de famílias de pacientes que contavam com a liberação do CBD. Famílias do Brasil inteiro entravam em contato umas com as outras, formando uma rede. Em pouco tempo, havia chats, grupos de discussão no WhatsApp e grupos no Facebook em que pais e mães conversavam, sugerindo dosagens e formas de se obter o medicamento. Sem suporte da justiça ou da medicina, esses familiares eram seus próprios médicos, seus próprios advogados e comunicavam entre si as novidades. Salas de jantar se tornaram quartéis generais, onde pais aflitos se reuniam para discutir formas de ação.

Não demorou muito, no entanto, para que as divergências de opinião ameaçassem separar os grupos. Quando o médico e pesquisador da USP de Ribeirão Preto, José Alexandre de Souza Crippa, que faz parte de um grupo de especialistas que pesquisam canabinoides há décadas, começou a reunir voluntários para participar de testes clínicos que comprovassem a eficácia do CBD nos casos de epilepsia, uma exigência foi feita: os pais que quiserem ter seus filhos participando do projeto, não podem estar envolvidos em ativismo. Isso assustou Cida, que pensou muito sobre o assunto. Ela tinha fotos na Marcha da Maconha e estava envolvida com ativistas, que a ajudavam muito. Sentiu-se excluída ao ouvir, ainda, comentários de outras mães chamando ativistas de “maconheiros” e cultivadores de “jardineiros” com profundo desprezo, afirmando não querer qualquer envolvimento com eles. Diante de alegações de que ativistas a favor do uso recreativo estavam usando as crianças para alcançar a legalização da erva para fins recreativos, Cida recuou. Estava excluída da pesquisa.

Algumas mães tentaram convencê-la a apagar as fotos, cancelar sua página no Facebook, a “Síndrome de Dravet Brasil”, e a pensar na Clárian. Cida se viu forçada a escolher entre ter acesso ao medicamento de sua filha e desistir de seus princípios. Ela havia sido ajudada por ativistas que também usavam a erva medicinalmente, mas que precisavam do THC. Ela havia sido ajudada por advogados e até médicos a favor do uso recreativo, que não pediam nada em troca de seus serviços. Ela precisou rever valores morais até então simplificados em sua mente, mas que agora emergiam com tal complexidade que nada mais parecia fazer sentido.

Quando criança, Cida conviveu com um parente usuário de drogas. Cresceu com a certeza de que drogas eram ruins e, portanto, deveriam permanecer proibidas. No entanto, ela recorda com clareza que a mãe sabia identificar, quando o parente aparecia em casa, qual droga ele havia utilizado. Quando ele chegava agressivo, agitado e não comia, ela dizia:

– Hoje ele cheirou cocaína.

Quando ele chegava calmo e sentava com a família para jantar, a mãe comentava:

– Hoje ele fumou maconha.

Cida sabia a diferença entre as drogas, mas a canábis era agora a salvação para sua filha e, como pôde perceber, para milhares de outras pessoas. Ela resolveu participar de um grupo de pesquisa que não a discriminava, ou os outros pacientes, – e que não a forçava a determinar com clareza o complexo limite entre o que seria uso medicinal e o uso recreativo – e se encontrou com o Dr. Faveret, no Rio de Janeiro. O neurologista criou a APPEPI (Associação de Parentes de Pacientes com Epilepsia), onde reuniões com familiares de pacientes aconteciam para organizar um pedido de autorização de plantio da canábis para fins científicos. No entanto, o processo era longo e Cida precisava conseguir acesso ao medicamento de outra forma, antes que o óleo que havia contrabandeado acabasse.

Cida conseguiu então o contato de uma pessoa que mudaria por completo a sua situação: Dr. Eusébio.

**Essa história não acaba aqui, ela faz parte do livro “Ervas Daninhas”. Postarei mais em breve!**