Pilotos e comissários de diferentes companhias aéreas temem pelo pior
O Brasil foi selecionado para receber tanto a próxima Copa do Mundo de Futebol, em 2014, quanto as Olimpíadas de 2016, dois grandes eventos esportivos internacionais. O Ministério do Esporte estima que somente a Copa do Mundo atraia 3,7 milhões de turistas para o País entre junho e julho do ano que vem. Existe, no entanto, uma preocupação por parte de profissionais da aviação sobre a falta de preparação dos aeroportos para receber tal número de visitantes.
O problema
Os números assustam. Segundo um estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas, estima-se que o fluxo de turistas aumente 79% entre 2011 e 2014 devido à Copa, o que excede a capacidade de muitos dos aeroportos das cidades onde o evento acontecerá. Em 2001 já se utilizavam 65% dos assentos oferecidos por companhias aéreas, tanto para voos nacionais quanto internacionais, no total dos aeroportos brasileiros. Nos últimos 10 anos, poucas melhorias ou ampliações foram efetuadas, enquanto que a demanda por voos tem crescido anualmente (com exceção de uma diminuição de 5 % na demanda entre 2002 e 2003) desde então.
Rodrigo Constantino, autor do livro “Privatize Já” (2012), afirma que “um estudo da McKinsey de 2010 estimou em 20 bilhões de dólares a necessidade de investimento dos 20 principais aeroportos brasileiros”. Ainda em sua obra, Constantino afirma que “segundo a instituição Contas Abertas, os aeroportos brasileiros receberam, em valores atualizados, somente 4,3 bilhões de reais em investimentos entre 1995 e 2010, o equivalente a menos da metade do orçamento aprovado”.
Do ponto de vista dos aviadores
Pilotos, comissários e outros profissionais da aviação notam a diferença que a falta de investimento faz. Um comandante da TAM, que não quis ser identificado, diz ter “a mesma opinião de 99,9% dos aviadores”, de que os aeroportos estão longe de estar preparados para a Copa do Mundo. Um grande problema, segundo ele, é a saturação dos aeroportos: “Você pode ver em ‘feriadões’, época de festas de fim de ano, Carnaval e férias que já não há mais como aeroportos suportarem a demanda; não há vagas nos estacionamentos, banheiros suficientes, posições de check-in e nem mesmo lugar para sentar”. O comandante afirma conhecer todos os aeroportos das cidades onde os jogos acontecerão e diz que “com muito esforço, somente o aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, o Galeão, no Rio, o Confins, em Belo Horizonte, e o aeroporto de Brasília teriam o mínimo de condição” para receber os turistas. Isso se as reformas já tivessem sido concluídas, ele faz questão ressaltar.
Um piloto da ABSA Cargo, diz que em São Paulo, onde estão localizados “os dois aeroportos mais movimentados da América do Sul”, Cumbica e Congonhas já estão “saturados com o volume normal do dia-a-dia de tráfego aéreo”. Segundo ele, um grande evento como a Copa congestionará ainda mais esses aeroportos, “tanto no âmbito aéreo como na estrutura de pátios”. Ele afirma ser comum pousar e ficar aguardando nas “taxiways” pela liberação de um local para estacionar a aeronave, o que pode ser um risco para a segurança.
Os profissionais da aviação entrevistados concordam, unanimemente, que já é tarde para se aplicarem soluções de real efeito no caso dos aeroportos. Carolina Santos, comissária da TAM, trabalha em voos internacionais e usa o aeroporto de Guarulhos com frequência. Ela acredita que Cumbica está operando “acima de sua capacidade” e menciona a construção do terminal 4 “chamado de puxadinho”, que “tem deixado muito a desejar”. Do terminal 4, saem apenas voos de duas companhias: Azul e Passaredo. Já o terminal 3, que está em construção, promete atender a um número maior de pessoas, recebendo um investimento de R$ 2,6 bilhões, segundo apuração do G1. A conclusão das obras, porém, está prevista para 2031, muito depois dos grandes eventos serem sediados no Brasil.
Possíveis soluções
Uma das soluções empregadas pelo governo para solucionar o problema dos aeroportos é recorrer à iniciativa privada. Em 2012, o governo Dilma realizou um leilão pela concessão por 20 anos dos aeroportos de Guarulhos (Cumbica), Campinas (Viracopos) e Brasília (JK). Porém, segundo Rodrigo Constantino, “o processo foi feito às pressas e com atraso de alguns anos”.
Outra solução de improviso, cogitada por alguns dos pilotos entrevistados, é remanejar a aviação executiva para aeroportos menores e bases aéreas, o que pode prejudicar negócios de empresas que já movimentam a economia brasileira. O Ministério do Esporte estima que os turistas representem uma receita de 9,4 bilhões de reais durante a Copa do Mundo, mas esse montante pode não compensar as perdas que empresas tendem a sofrer devido a dificuldades no transporte aéreo, entre outros transtornos causados pelo excesso de turistas somados à falta de estrutura.
A maior parte das obras em preparação para a Copa que podemos observar até o momento são ampliações dos terminais de passageiros, focando nas áreas comerciais de aeroportos, para que acomodem mais lojas e restaurantes. O resultado é que teremos melhores shoppings do que terminais nos aeroportos brasileiros. Apesar disso, a Infraero afirma que está trabalhando para melhorar os aeroportos – com R$ 4,6 bilhões gastos em obras – e que eles atenderão à demanda de turistas que visitarão o país durante a Copa. Ao colocar na balança o que afirma a Infraero em contrapartida ao que afirmam aviadores e estudiosos, é mais recomendável evitar os aeroportos durante o período da Copa do Mundo, a não ser para ir às compras.